Economia e Cultura
Tati&Arte&Manha
No.1
A Economia da Cultura. A Economia da Cultura é uma inovação de abordagem americana do século 21. A Política Econômica foi uma imposição das Grandes Guerras na Europa dos séculos 19 e 20.
Contemporaneamente, a sociedade destina um espaço relevante à Economia e aos problemas econômicos, resultado, em grande parte, da difusão de informação econômica através dos meios de comunicação. Resultado disso é que Economia, agora, é tema de preocupação dos cidadãos, motivo pelo qual todos os partidos políticos incluem Economia na pauta de seus programas com distintos objetivos de política econômica. Entretanto, a práxis de políticas econômicas é uma ação de tão grande impacto que seus resultados têm de se considerados como ilustrativos de contextos: geográficos e políticos.
Para comentar brevemente essas questões referentes ao que seja pertinente à Economia, escolhi o apoio de um grupo de autores economistas que são também professores e trabalham juntos. Decidi por um grupo de espanhóis por entender que Portugal dividiu com a Espanha o continente americano e nesta "ação entre amigos" nos "contaminou" a todos repartindo ideias, costumes e limites por toda América. Os economistas escolhidos ensinam na região centro-sul do reino, cobrindo as universidades de Alcalá, Málaga, Castilla-La Mancha e Granada. Costumam publicar seus livros pela editora McGraw-Hill que tem distribuição em toda Europa, América e Ásia, portanto, considerei que sua abrangência é um "plus" de credibilidade.
Sua primeira referência ao economista vem do também economista e escritor , pioneiro da macroeconomia (focaliza o comportamento da Economia como um todo sistêmico), John Maynard Keynes (1883-1946). Keynes escrevia que "o estudo da Economia não parece que requeira dotes especialmente relevantes" ao que agregava "um bom economista, ou simplesmente competente, é uma autêntica raridade. (...) Talvez o paradoxo se explique pelo fato de que, em Economia, o professor deve possuir uma rara combinação de dotes (...). Deve ser (...) matemático, historiador, estadista, filósofo; manejar símbolos e falar com palavras; contemplar o particular do prisma geral, abordar o abstrato e o concreto com a mesma ideia. Deve estudar o presente à luz do passado e com os olhos no futuro". Isto foi escrito em 1924, em seus "Ensaios biográficos", mas, nem todos os economistas estão de acordo e é bom saber porque: (1) as premissas de qualquer análise econômica condicionam suas conclusões e resultados; (2) é difícil quando nosso trabalho está dado sobre o humano, evitar a introdução de juízos de valor; (3) em Economia, como em qualquer outra ciência social menos exata, as leis costumam ter caráter estatístico/probabilístico e não causal. No campo da Política Econômica estão presentes os valores, opiniões e preferências ideológicas, sempre, nas propostas e nas medidas para alcançar um fim socialmente desejado.
A meta deste comentário é que o leitor compreenda quais os conhecimentos e conceitos que podem lhe servir de instrumento.
A Economia, enquanto ciência social está classificada como empírica (as outras classificações são ciências formais e ciências factuais), o que é de muita complexidade como lembra Q. Gibson, em 1964, ao dizer que o objeto da ciência social é o "homem enquanto ser social, suas ações, suas reações, suas relações e o próprio acontecer social". Além do complexo, a segunda questão problemática mais relevante é a dificuldade de estabelecer leis gerais; tudo é muito condicionado cientificamente ("se isto, ..., então provavelmente aquilo").
A Teoria do Conhecimento e as obras específicas sobre metodologia da ciência econômica indicam os âmbitos onde a ciência tem possibilidade de dar respostas. Como ciência empírica, concretamente pesquisa os fenômenos perguntando-se O QUE?, QUANDO? ONDE? e predominantemente POR QUE?, dispondo uma base que permita atuar sobre determinada realidade, seja transformando-a, aproveitando-a, ou corrigindo e resolvendo os problemas do homem individual ou social. Nas ciências sociais "as práticas são obrigatoriamente mais avançadas do que as teorias". A Economia, como ciência orientada à práxis, distingue-se das demais ciências sociais quanto ao objeto e às metodologias. Distingue-se pela atenção a seu objetivo característico: fenômenos sociais da produção, intercâmbio, distribuição e consumo de bens. Some-se a isto o nível de abstração formal adotado, que no caso da Economia é o nível prático de política social (os demais são descritivos).
A aceitação dos aspectos teóricos da ciência econômica, como em qualquer outra ciência, vem dar forma aos dados e observações que serão sujeitadas a interpretações baseadas nas experiências anteriores acumuladas, nas crenças e também nos sentimentos. Keynes distinguia a Economia Política como a ciência positiva (o estudo do ser) da Economia Aplicada, chamada de arte, definida como ramo da filosofia política e social interessada em questões econômicas. Keynes identificava também outro ramo como o moralista que é a ética na economia política. Ao contrário do caráter positivo da Economia, seu oposto, o normativo, está relacionado à prescrição de como as coisas devem ser, como seria conveniente atuar, pensar ou raciocinar. Essa vertente econômica está relacionada à prescrição, recomendação, prática, ação, regras (normas), arte, juízos de valor, declarações imperativas e expressões não comprováveis, sentimentais, no que se aproxima da Política Econômica enquanto práxis pelas características de (1) Política Econômica é sempre resultado de uma decisão da autoridade (sentido amplo); (2) Política Econômica é sempre uma ação deliberada por parte da dita autoridade; (3) Política Econômica toma como referência um fim e objetivos desejados e para alcançá-los utiliza determinados meios e instrumentos.
Nada disso ocorre no vazio. O marco dessas relações está previamente definido como um conjunto de princípios gerais que caracteriza dada economia o que vai desde a economia de mercado até às economias mistas, respondendo, em cada caso, a um modelo de organização da vida política e econômica, sendo que entre eles há tipos e princípios comuns que se ajustam no que se chama "sistema econômico". Sistema provém do grego e significa reunir, portanto, algo que está organizado - para funcionar - de determinada forma, e que se maneja com um fim específico, eficiente. Como todo sistema, deve ser pensado como : detentor de critérios de propriedade; organizado para uma forma de distribuição (dotação) por transferência (roubo, guerra, economia tribal ou impostos, por exemplo) ou por sistema de intercâmbio (mercado de mercadorias e trabalho - o capitalismo - ou mercado só de mercadorias); liberdades; soberanias; preços; falhas; efeitos externos ao sistema; preferências; intervenção governamental no mercado. As possibilidades da práxis são do tipo instrumental e setoriais (específicas), que, contemporaneamente, devem considerar a ocorrência de imprevistos, desde catástrofes climáticas até guerras, desenvolvimento crítico que deteriorem a situação e novas (mudança de) ideias, na vida do(s) país(es) onde a exposição de arte em questão toma lugar.
(sobre este assunto ler também a coluna do Coreconrs no Jornal do Comércio de Porto Alegre, de seta-feira, 17-18-19/08/2007, entrevista do economista e professor Stefano Florissi; sobre formação universitária de especialistas ver www.ppge.ufrgs.br/cultura)
No. 2
Economia para não desenvolvidos. O desenvolvimento através das gerações foi uma das preocupações do Banco Mundial para o novo milênio, ou seja, na entrada do século 21, há quase 17 anos. Neste sentido foram convidados economistas de várias academias do desenvolvimento - portanto os formadores das gerações seguintes - e os praticantes daquelas teorias, para opinarem a partir de suas experiências originadas nas discussões em torno da pobreza internacional, o mundo do desenvolvimento e o mundo industrializado dos anos que seguiram à Segunda Guerra Mundial e à Grande Depressão, num esforço retrospectivo já empreendido de maneira revisionista (da teoria econômica) por Alfred Marshall, em 1987, refinando o marginalismo a partir da Universidade de Cambridge, Inglaterra. Dentre eles estava Gerard M. Meier, professor Konosuke Matsushita (analogia cultural ao mestre japonês do "espaço dô" = "espaço construído") de Economia Internacional e Análise de Políticas, Emérito, da Universidade de Stanford.
Ele começa por destacar que no pós-Guerra os países em desenvolvimento, e seus governos independentes, em busca da aceleração de seu processo foram a procura da assessoria dos economistas cedendo-lhes o tema. Esse movimento rumo à independência econômica que introduziram "crescimento econômico" e "progresso" na pauta da Ásia e da África, terminou com a revolução marginalista de 1870 elaborada e desenvolvida por Karl Menger, William Jevons e León Walras, e produziu a um retorno aos economistas do Reino Unido e da América, a partir dos 1950s, restabelecendo as relações da teoria clássica (1776-1819) do valor-trabalho, diferenciando a função de produção em Y=f(K,L,t), onde Y é produto, K é capital, L é mão-de-obra e t é tempo na mesma decomposição simples de Solow (1957). Os seguidores desta geração de economistas - a partir de 1975 - foram uma geração de economistas de sóbrio realismo apoiado nos princípios da economia neoclássica (marginalista) predominante no pós primeira Guerra Mundial e fundamentada na teoria subjetiva do valor da utilidade marginal, que teve destaque naquela época na Inglaterra (Marshall), Viena (von Böhm-Bawerk), França (Walras/Pareto) e E.U.A. (Clarck e Fisher). Essa segunda geração de economistas que teve tempo de refletir sobre três décadas de experiências de desenvolvimento reconheceu a heterogeneidade crescente dos países em desenvolvimento e se dedicou a estudos econométricos sobre os determinantes do crescimento nestes países e os diferenciais e suas taxas de desempenho, estabelecendo enfoque comparativo com intuito explicativo, formulando uma teoria positiva da política, com conceitos analíticos e princípios.
Para acompanhar a heterogeneidade dos países em alcançar "seu" desenvolvimento, introduziu-se o papel das organizações e das instituições naquelas experiências, mesmo diante de modelos de mundo competitivo ideal sem instituições e com mínima interferência no estabelecimento de mercados eficientes. A estrutura de incentivos da sociedade - os incentivos são fundamentais ao processo de mudança, portanto ao desenvolvimento - é função da estrutura institucional da sociedade. As instituições são humanamente idealizadas e formatam a interação humana formal e informalmente. O desempenho econômico é determinado justamente por essas constituições, leis, regras, regulações, normas de comportamento, convenções e códigos de conduta auto-impostos. O que foi avivado pela economia neoclássica nesta segunda geração foram os aspectos de ação coletiva, poder de negociação, capacidade estatal e processos políticos que haviam sido ignorados.
Uma economia em desenvolvimento é uma economia em processo de mudança o que requer um alto nível de "capacidade social", pois estas mudanças vão intervir nos acordos sociais através dos quais as pessoas são induzidas a cooperar e participar na atividade econômica para atingir seu desenvolvimento potencial.
Para alguns economistas como Paul Collier (1998) "capital social" é a coerência social e a cultura interna da sociedade. São as normas e os valores que governam as interações entre as pessoas e também as instituições das quais estas pessoas fazem parte. Quando uma interação social gera externalidades - neste caso confiança e lealdade são exemplos, pois têm valor real e prático incrementando a eficiência do sistema permitindo produzir mais bens (valor econômico) que mantenha a alta estima, sem que sejam mercadorias para o mercado aberto do comércio técnico - e facilita a ação coletiva por benefícios mútuos fora do mercado o capital social obtém um retorno econômico.
Condicionantes da interação dos agentes e geradores de externalidades definem o "capital social civil" de que são exemplos a confiança, a reciprocidade, as redes interpessoais, a cooperação e a coordenação.
O "capital social governamental soma a estes os benefícios da lei (força do contrato), da ordem, dos direitos de propriedade (segurança), educação, saúde e "bom governo" (efetividade das burocracias públicas). A ênfase sobre o capital social (ou cultura, instituições e padrões de comportamento) deveria embasar a explicação do processo de mudança dentro de um esforço multidisciplinar com conexões mais fortes entre economia do desenvolvimento, nova economia institucional e nova sociologia da economia.
O que a história do desenvolvimento econômico ensinou coincide com o que afirma Max Weber: a cultura faz toda a diferença. Entretanto, o temor acadêmico esbarra na carga que a cultura passa a ter de racismo, hereditariedade e imutabilidade - as origens das crenças culturais - tocando o ego e afetando a identidade e a autoestima.
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Neste momento entra em cena a habilidade de usar o conhecimento para dar forma às pessoas e às coisas, o que implica em elevada passividade na observação que se coloca entre a condescendência e o distanciamento prudente.
A primeira geração de economistas do desenvolvimento do pós-guerra deu preponderância à cultura como facilitadora ou restritora do crescimento econômico, como é o caso dos judeus e calvinistas por toda a Europa - minorias expatriadas com impacto sobre as respostas das sociedades da modernização da vida comunitária e das possibilidades do desenvolvimento econômico nacional, afetando inclusive a reputação das economias que fazem sérios esforços por incorporar variáveis culturais.
A atenção à cultura está relacionada ao desenvolvimento institucional - instituições fortes, respeitáveis e de representação efetiva com governabilidade e consequente crescimento econômico.
A política governamental tem resoluções normativas. Isso é consequência da teoria positiva da nova economia política (neoclássica) na qual o governo endogeniza o desenho das políticas num "paradoxo de determinância" e na definição da forma como a política econômica do bem-estar deva ser conduzida. Outros elementos de psicologia social podem intervir na tomada de decisão, assumindo que é impossível uma caracterização universal simples do comportamento político quando o Estado unitário cede á agregação de preferências. A nova economia política implica num Estado mínimo, em países em desenvolvimento, reapresentando a questão relacional entre liberdade e desenvolvimento, cujas conexões empíricas e conceituais são discutidas por Amarthya Sen (1999). Quando o tema é o desenvolvimento é básico reconhecer que as liberdades são tanto o objetivo básico como seu meio principal. Enquanto objetivo não pode estar dissociada da vida cotidiana como desfrute real. Para seres humanos responsáveis importa a liberdade para fazer o que pensam que tenha valor e não em termos de melhorar as condições de vida de objetos inanimados. Além dessa conexão constitutiva reconhecida através da análise empírica das consequências e interconexões de diferentes tipos de liberdades e a evidencia de que esta diversidade tipifica a sustentabilidade de outras liberdades, funciona como agência motora do desenvolvimento, por sua relevância e papel consequente. A questão da liberdade social em Sen (indiano) é de tal importância que ele a denomina oportunidade social, ou seja, as liberdades que o Estado e a Sociedade permitem, como possa ser a educação pública para mulheres enquanto libertadora das restrições do analfabetismo e da ignorância, que além de ser valiosa em si mesma contribuem ao desenvolvimento econômico, ao uso mais compartilhado dos mecanismos de mercado e ás liberdades específicas resultantes da prosperidade econômica, no longo prazo. É o "progresso da razão" palavras do matemático francês Concorcet, pensador da ilustração, seguido por Malthus. Para Sen, "la idea del desarrollo basado en la libertad captura el papel constructivo de seres humanos libres (...)" (2002).
(sobre Teoria do Desenvolvimento ler também coluna do Coreconrs no Jornal do Comércio de Porto Alegre de 14-15-16/09/2007, entrevista do economista, doutro e professor da PUCRS, Nali de Jesus de Souza)
No. 3
Comerciar. As feiras eram um espaço típico de comércio, nas quais se organizavam os mercadores emitindo letras de câmbio que tinham bancos específicos para serem resgatadas. Além de venda a crédito, faziam empréstimos a juros, obtendo lucro e aumentando seu capital. Surgiram "compagnie" de mercadores da Alemanha e França, numa nova organização do trabalho. Cada local era mais propício do que outro para os negócios e os produtos, em sua origem, indicavam especializações. Dentre as feiras, a de Veneza sempre foi atrativa. A cidade era famosa por seus vidros, suas especiarias, essências de cravo (água nanfa) e sedas. As trocas comerciais eram feitas através da moedagem corrente: soldos (moeda romana de ouro), denários (moeda de prata romana), denários viennesi, denários sterling, denários colonesi, ...O horário era o da jornada ("ora prima", "tercera hora", "vésperas", etc.) e a única língua universal era o latim, usado pelos homens da Igreja ou eventualmente algum nobre. As populações falavam idiomas e dialetos de origem francófana, germânica ou franco-normanda. Assim era em 1200 d.C.. Muito tempo se passou enquanto o comércio com o Oriente se intensificava e a monarquia se consolidava na Europa incentivando as ciências e as artes com a criação de academias: de Belas Artes, em Roma; de Ciências, Arquitetura e Música, em Paris, onde os franceses alcançavam beleza e grandeza raciocinando. Os poetas e artistas iam à Corte aprender sobre a cidade no ambiente político dos espíritos cultivados, onde os literatos se entretinham com a estética e a retórica.
O sistema equitativo - sensível às novas exigências - se impõe sobre o sistema tradicional sobre o qual elabora e sistematiza novos princípios que eram de exceção e passam a ser de aceitação comum, fazendo com que acepções distintas e contrapostas progressivamente se fusionem.
O direito de comerciar historicamente é um direito de normas e princípios, especial, originariamente aplicado em âmbito particular que, com o desenvolvimento histórico sucessivo encontra aplicação mais vasta de acordo com o desenvolvimento das relações econômicas e sociais até se constituir em direito comum, porém especial e autônomo quanto às suas obrigações.
Na América Latina, os direitos civis e do comércio derivam dos sistemas romanísticos da Europa continental subordinados ao direito privado. Entretanto, não é o direito da administração e produção de riqueza. Também não abrange a atividade agrícola. Não é o direito de circulação. Não é o direito de intermediação, nem o das empresas. Está sim relacionado a um tipo de produção de grande escala, unificando, desta forma particular, as obrigações da lavoura, do comércio e da indústria.
A fratura entre o direito romano canônico das comunas (comunidades de caráter igualitário criadas com objetivos econômicos e políticos, eram cidades autônomas governadas por mercadores ricos, voltados à defesa de seus habitantes - comerciantes e artesãos. O senhor destas cidades era um bispo ou barão e sua autonomia se dava por revolta ou compra desse direito) italianas no século 12 e as exigências econômicas sob elas impostas que resultaram no que atualmente denominamos capitalismo, originaram o direito de comércio. Inicialmente transmarino e bancário, continha exigências ausentes de liberdade de iniciativa e de concorrência num mercado livre. Liberado dos vínculos da sociedade feudal, alcançou também a atividade industrial. Sua evolução está embebida da ideia de mercado e este dos institutos do seguro (originalmente marítimo) e do empréstimo a risco. Sua autonomia não se prendendo aos direitos estatais estava assentada no consentimento e no costume dos interessados, sucessivamente consolidados nos usos medievais de jurisdição consular particular, muitas vezes contraposta à jurisdição geral comunal.
A renascença do comércio e da vida econômica exigiu um sistema contratual de complexidade e elasticidade com cunho formalístico no princípio da obrigatoriedade vinculada a determinados contratos como fonte exclusiva, permitida a liberdade de formas. Restabelecidos o comércio, as comunicações e o hábito de escrever, inova-se com a conclusão dos contratos entre ausentes, superando os textos romana os clássicos em seu domínio do contrato entre presentes e o contrato verbal. os canonistas vieram em socorro com suas premissas éticas pelo valor do consentimento em favor do contrato escrito e do contrato entre ausentes.
Um novo elemento - a vontade - do representante/ausente e do agora também representado (outorgante de poderes), frisam a diferença entre abuso e excesso de poder. Esta elaboração teve caráter internacional anterior à constituição dos estados nacionais.
É Benevenuto Stracca (século 16) o primeiro e um dos maiores escritores profissionais do direito de comércio. As primeiras sistematizações legislativas completas dos seguros são catalãs; o português Santarém fez o tratado dos seguros; o endosso é de origem francesa; Flandres impulsionou os negócios da bolsa e José da La Veja (1681) mantém-se atualíssimo; as patentes de invenção começaram no estatuto inglês de monopólios que foram precedidos pelas leis ditadas em Veneza nos séculos 15 e 16. No século 17, com a fortificação dos Estados monárquicos centralizados, estes assumiram o monopólio de legislar sobre o comércio como disciplina real (Luis XIV). Deixa então de ser um direito de classe, mas conserva sua autonomia como direito, passando a influenciar o direito comum, sendo codificado em regras (napoleônicas) comerciais à qualquer ato mercantil, independente da pessoa do agente comercial.
O problema do século 19 - característica fundamental da sociedade moderna - foi o da mobilização do crédito (de curto a longo prazo), não apenas para o consumidor, senão que para o empreendedor (obtenção de grandes capitais) - o industrial e o comerciante, questão diretamente relacionada à circulação de direitos. Assim foi superado o conceito do direito tradicional assente na conexão do direito com o seu sujeito e, elaborada a disciplina de aproximar a circulação dos direitos às das coisas - o direito objetivo.
A codificação brasileira do direito de comércio data de 1850, sendo, portanto, de influência da tradição do direito romano comum dos séculos 17 e 18, manifestando-se no caráter prevalentemente familiar das sociedades anônimas.
Constituíram ponto de partida do direito de comércio, historicamente (1) a mediação - ramo de atividade em que, inicialmente, se manifestaram historicamente as novas exigências; (2) circulação - característica fundamental do sistema econômico e que se foi elaborando quando considerando sua relação com o mercado; (3) empresas - característico desse sistema quanto à organização técnica da produção. Atualmente, é função de muitos institutos do direito de comércio à produção em larga escala, que concerne igualmente à técnica de produção.
A primeira companhia colonial, datada de 1602, a holandesa das Índias, originada pelo interesse pelo Extremo Oriente e presa à colonização do novo mundo recém-descoberto pela Europa do século 17, resultou de uma união (estudada em vários países europeus no final do século 16 e constante de um projeto português não realizado datado de 1587) entre vários condomínios marítimos.
Constituída pela lei especial que a reconhecia, assentou a personalidade jurídica com a separação dos patrimônios e a possibilidade de uma mudança de sócios. independentemente de uma alteração dos estatutos. A responsabilidade limitada do acionista tem origem no direito marítimo quando a companhia holandesa das Índias se formou a partir das várias comunhões de armadores do direito germânico. A função econômica e social destas sociedades anônimas decorre do fato de constituírem um instrumento jurídico para recolher economias em vastas camadas da população, angariando capitais que superam as forças econômicas de indivíduos isolados ou de pequenos grupos que não poderiam, pessoal e diretamente, constituí-la e administrá-la (pela monta de suas economias ou por seus afazeres), mas que, entretanto, são necessários.
A circulação de ações por seu turno, tinha precedente na circulação de títulos das cidades italianas da renascença, quando em um banco como o de San Giorgio em Gênova, debenturistas se reuniram para administrar os bens do devedor. A empresa jurídica dos séculos 19 e 20, já com viva orientação estatal e mercantilista imita o modelo da lei francesa de 1867, oriunda do código napoleônico sancionador de liberdades de constituição das sociedades anônimas, tanto no Brasil como nos países da Europa continental e na América Latina. Se a difusão e circulação de ações entre os públicos, de início, era rigorosamente limitada, tutelada a contratação e pouca discrepância entre as partes, a partir de 1867 chegou-se quase a uma subversão de princípios, o que resultou em duas tendências manifestas: a ideia do patrimônio separado cuja importância levou às anônimas de um sócio apenas e anônimas familiares e à colocação das suas ações no público. Surgem daí os problemas relativos à constituição de monopólios ou oligopólios e do seu contraste com a expansão econômica no interesse de todos, mesmo para os que discordem dos que fazem da clientela objeto de proteção, posto manterem os clientes liberdade de compra e de escolha enquanto consumidores, já que existe liberdade de concorrência.
Aplicada ao mercado internacional levou à aplicação do livre-cambismo, defendido fundamentalmente pela Inglaterra, ansiosa por colocar seus produtos em todos os mercados europeus e coloniais.
As colônias americanas se exaltavam por questões de direito. O que eram puras filosofias nos países metropolitanos de intensa atividade comercial, de vida intensa e trato de gentes variadas, na monotonia das colônias, com a mentalidade inativa dos ali imigrados, eram o suficiente para causar algumas vezes efeitos tão desproporcionais como insólitos, como foi o caso da aplicação das premissas do Contrato Social de Rousseau na América pelo governo de Londres e seus súditos em 1714, o que na França não teve aplicação antes de 1789. Por outra parte, as colônias enviaram a Londres para discutir o assunto a Benjamin Franklin com seu discurso de direitos naturais, dos americanos - os cidadãos ingleses que serão membros do corpo político dos E.U.A., apoiados, então, exclusivamente nos pilares da Constituição.
O liberalismo defendia a mais ampla liberdade individual, o que havia convencido os rentistas, empregados, literatos, advogados e professores de que podiam opinar livremente em religião, moral, legislação, economia política e administração. Além disso, o "laissez-faire" não previa espaço para a ação econômica do Estado que teria como função garantir a concorrência empresarial de maneira livre e o direito de propriedade privada quando esta estivesse ameaçada por convulsões sociais.
No. 4
Arte "Povera" e a soberania do consumidor. Segundo a curadora de arte Ana Zavadil (2014), "Na história da arte, a Arte Povera, ou a arte pobre, foi um movimento dos anos 1960, fortemente inclinado em direção a uma ruptura com a produção artística mais convencional daquele período. Os materiais nobres, usados até então, são substituídos por materiais de baixo valor, geralmente sem utilidade, reciclados ou frágeis. (...) Essa inclinação artística dava mais importância ao processo do que ao produto, o que nos parece familiar nos dias de hoje no momento em que a obra de arte é crítica ou de reflexão e traz um apelo à sensibilidade."
O precário também passou a ser tema na arte, especialmente com o advento do romantismo. É o caso de "Os Miseráveis", de Vitor Hugo em 1862, na literatura; os retratos de doentes mentais e mendigos de Théodore Géricault, no século 19, as histórias infantis contadas pelos Irmãos Grimm, que foram coletadas da tradição oral na região de Kassel, na Alemanha (1812-15).
O cânone da beleza se referia também à escolha de materiais e seus fins. O tamanho também se relaciona com a nobreza e importância do tema.
A partir da Idade Média, em países europeus, os atelies e as guildas - associações que agrupavam indivíduos com interesses comuns (mercadores, artesãos, artistas) em defesa de seus interesses econômicos e profissionais, estabeleciam o modelo para que os artistas se relacionassem com os materiais e técnicas artísticas. Esse conjunto de regras de trabalho resultaria na durabilidade e na continuidade das ideias contidas na obra. A natureza dos materiais era estabelecida por seu valor de troca e raridade.
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John Kenneth Galbraith (1908-2006), economista canadense, filho de escoceses, de postura liberal keynesiana e reformista foi o precursor do Código de Defesa do Consumidor.
Para ele, a circunstância econômica tem uma influência dominante nas atitudes sociais da sociedade pobre, porque para os que são pobres nada é mais importante como a sua pobreza. Entre os pobres, somente a religião tem competido com a circunstância econômica na formação das atitudes sociais.
Citando Marx (1859), "O modo de produção da vida material determina o caráter geral dos processos social, político e espiritual da vida.", no dizer de Marshall (1907), "Aqui e ali o ardor do espírito militar ou do artístico, tem sido, por algum tempo, predominante, mas as influências religiosas e econômicas (...) têm sido quase sempre mais importantes do que todas as outras juntas."
Na sociedade pobre, as considerações econômicas dominam de fato as atitudes sociais, mas também especificam rigorosamente as questões que serão consideradas prioritárias. Estando a necessidade psíquica em paridade com a necessidade física e sendo infinitamente plástica a premência do aumento da produção -, e por conseguinte do problema econômico - não diminui com o aumento do bem-estar. Uma população crescente, e particularmente uma população urbana crescente, aumenta o atrito de uma pessoa com a outra e o gosto necessário para a harmonia social. É razoável supor que uma proporção crescente das necessidades de uma comunidade cada vez mais civilizada encontra-se por sua natureza no domínio público, e que no Estado moderno há cessão da soberania do indivíduo ao produtor ou à organização. Há defesas no sentido de que existem modificações de gosto endógenas, induzidas pelos investimentos do produtor, destinado a efetuar tais modificações.
A concepção consagrada, entretanto, é de que a vida econômica continua a ser um processo pelo qual o indivíduo impõe sua vontade ao produtor - a soberania do consumidor.
São três as concepções consideradas plausíveis a respeito do indivíduo na sociedade econômica: (1) o indivíduo é considerado um participante neutro ou passivo num processo de transmitir modificação. Pode começar pelo indivíduo, refletidas em seu consumo e assim transmitidas ao produtor através do mercado, ou pode originar-se do produtor. Em cada caso a preocupação é com o processo, e todas as modificações são transmitidas pelo mercado (os bens públicos não são satisfatoriamente abrangidos por esse modelo); (2) embora o processo seja presumivelmente um transmissor neutro de modificação assim como a modificação originada no produtor, a orientação fundamental vem do indivíduo, fazendo-se a ele a adaptação fundamental. A adaptação às modificações na função custo do produtor é neutra e técnica; a adaptação às modificações na função procura do consumidor é funcional e moral e abrange a funcionalidade do sistema. Este caso se adapta melhor às preferências do cidadão e eleitor individual pelos bens públicos. Admite-se as influências externas ao mercado, incluindo publicidade e influência competitivas e culturais. Para os bens públicos a informação é transmitida mais imperfeitamente pelo mercado e pelo processo político. A função procura é dada, o que quer dizer que se origina dele e não do produtor; (3) a adaptação fundamental, em grau significativo, compete ao produtor, através do qual a firma produtora controla seus próprios preços no mercado.
Paul Samuelson, economista líder reconhecido da comunidade da revolução keynesiana (que se contrapôs ao marxismo e se apresentou como alternativa à tradição econômica clássica não-socialista), afirma, em 1963, que "embora o processo seja confuso, indireto e ineficiente. admite-se igualmente que o cidadão afinal impõe sua vontade à seleção de bens públicos e serviços fornecidos pelo Estado."
Na economia consagrada não existe conflito geral: o indivíduo ou cidadão é soberano, o que não excluí diferenças entre indivíduos diferentes. Pelo antigo consenso clássico, os ricos falam mais autoritariamente nos mercados do que os pobres, mas nada é sistemático: o indivíduo está suprema e fundamentalmente no comendo.
Quando admitimos soberania do produtor, ela é exercida por organizações grandes e complexas, reação lógica às necessidades da organização industrial (moderna e altamente técnica e capitalizada). O Estado que se configura num modelo como este se aproxima a um comitê executivo da grande organização produtora - da tecnoestrutura.
A pobreza afeta a maneira como as pessoas se comportam. O primeiro e mais elementar efeito da pobreza é reforçar as atitudes e o comportamento que a fazem autoperpetuante. De modo semelhante, o primeiro efeito da riqueza é admitir a liberdade que permite a criação de mais riqueza. Geralmente as comunidades muito pobres são conservadoras - mais do que as mais afortunadas seu povo resiste à reforma em seu próprio interesse - toda a reforma é olhada com inquietação ou pavor; não há reconhecimento da inovação técnica benigna. Assim sendo, os pobres são classificados como subdesenvolvidos e modelados em tipos: (I) africano sub-saárico, onde não há base cultural. O problema não é ausência de aptidões, mas a saída de colonização recente, às vezes de tipo repressivo; tampouco há uma elite privilegiada dominante. Como no caso do Haiti, este modelo pode tornar-se de desintegração, com reversão eventual ao tribalismo ou anarquia; (II) caso latino-americano: grande massa do povo muito pobre. A base cultural é ampla, sustentada por um limitado sistema de forte tradição intelectual. Como nos países árabes, o controle evidente é a estrutura social e a maneira como ela tende a subverter o incentivo econômico e a produção. Em muitos países as massas rurais são indígenas, havendo acentuada exclusão racial. os governos são instáveis ou cobiçosos e a indústria moderna é vulnerável e dependente de proteção externa. Aplica-se também ao Oriente Médio; (III) Ásia Meridional, a base cultural é muito ampla e o entrave é o mau proporcionamento dos fatores de produção. São países de população grande e densa.
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Pode-se sugerir que a beleza e a elegância são coisas boas por todo o prazer que propiciam a uma comunidade. O mais econômico é o que promete mais prazer ao menor custo; a eficiência não tem o direito de sobrepor-se à beleza, num conceito mais adequado de eficiência - agimos com eficiência quando maximizamos o produto (neste caso, a beleza).
No. 5
Impérios. Os E.U.A. foram fundados por protestantes ingleses e escoceses contra uma Igreja de Estado (como o "establishment" da Inglaterra), pouco devendo ao Iluminismo.
Em 1850, os E.U.A. se estabelecem como novo império mundial norte-americano. Na história da república, imperialismo, originalmente, fora um fenômeno territorial - não transatlântico e global - com o propósito de aquisição de terras. Neste caso específico a questão se dava entre Canadá, E.U.A. e México, pois a Groenlândia era território dinamarquês e o Alasca pertencente aos E.U.A.. A decisão foi dos progressistas republicanos, conscientes do poder dos mares - Pacífico e Caribe - que queriam para os E.U.A. a posição de potência mundial, com primazia para as raças norte-americanas anglo-saxãs (nórdicas e teutônicas). A outra opção eram os populistas, mas estes não tinham política externa.
Era generalizado no povo norte-americano o desejo por prestígio e expansão, o que deu popularidade à guerra contra a Espanha com apoio dos demais governos europeus, em 1898, que se puseram contra ela. Depois disso o único perigo para a República eram as conspirações internas dos anarquistas.
O expansionismo transformou-se em imperialismo e essa foi a era do poder do mar e da democracia. A zona do Canal do Panamá foi adquirida; foi construída uma grande Marinha, que influenciaria o sistema de poder político europeu. Criou-se um "novo nacionalismo" não cosmopolita que era a imagem norte-americana do jovem herói do Oeste e seu ar puro: o renovado e saudável homem anglo-saxão.
Em 1912, foi aprovado o imposto federal sobre a renda e as eleições populares para senadores. Henry Ford e a automobilização, no Meio-Oeste, se impunham de maneira nacionalista e pacifista, materialista e utilitária, enquanto a visão progressista e sociológica de que lutas da sociedade e de classes - crença fundamental de Marx - substituíram as guerras de Estados e de Nações.
Seis anos depois, Wall Street era a capital das finanças mundiais e o dólar o símbolo da nação credora. Chegara a vez do partido Democrata tornar-se ferrenho opositor de mais envolvimento com a Europa. Neste sentido propunha atitudes condutoras do isolacionismo: anti-alemão, anti-bolchevique, anti-radical, anti-semita, anti-imigrante e anti-europeu. A Era do Jazz (1920) conviveu com uma política de apartamento da Europa e expansão para o Pacífico e Extremo oriente no que se referia aos negócios, embora houvesse interdependência financeira da Europa Ocidental e Central e os E.U.A.. Para as repúblicas latino-americanas, a política era de não intervenção e isolacionismo pois junto ao anti-semitismo surgiu o anti-catolicismo nos estados do sul e do meio-oeste estado-unidenses, o que progredia casado com o avanço republicano, a Lei Seca e a educação sexual.
A Grande Depressão de 1930 foi uma crise de confiança nas instituições financeiras que não afetou as instituições políticas da República. Roosevelt reagiu com o "new deal" e o "welfare", salvando o capitalismo norte-americano (que é socialista em seus métodos e em alguns de seus objetivos) e reabilitando a confiança nas instituições financeiras . Roosevelt era um patrício (não um burocrata) empirista e otimista na perfeição da sociedade. Uma nova direita surgiu na Europa e nos E.U.A.: radical, populista e nacionalista.
Quando as duas guerras mundiais estouraram na Europa e na Ásia o "lend-lease" (programa de empréstimo consignado) de Roosevelt o tornaram um internacionalista (contra Hitler, Tóquio e a favor da Grã-Bretanha) que mantinha depósito de 2/3 do estoque de ouro do mundo. Outro nacionalista (republicanos), Henry Truman, emerge dos benefícios do "new deal" e assume a presidência dos E.U.A. no pós-guerras baseado no patriotismo empresarial que para eles significava anti-comunismo. Sua política, a doutrina Truman, é de apoio à Grécia e Turquia, somada ao Plano Marshall de reconstrução econômica da Europa Ocidental mais a O.T.A.N. (E.U.A. e Canadá em defesa da Europa Ocidental em tempos de guerra e de paz).
Enquanto C.I.A. (fazendo eco à ideia dominante no início do século de que a melhoria na democracia dependia da educação) tornou-se o principal instrumento de política externa norte-americana (e anti-comunista) a prosperidade popular sofreu um inchaço nos E.U.A.. O fenômeno deveu-se a três movimentos simultâneos: (1) o aumento da renda mais veloz do que o aumento dos preços; (2) a disponibilização de bens de consumo: (3) a disponibilização de crédito ao consumidor. Na década dos 1950s (1950-60) não houve guerras, teve poucas crises, respeitando os padrões norte-americanos propostos durante o governo do presidente Wilson (1912). No final dessa década foram enterradas quaisquer aspirações a uma união ou confederação anglo (Império Britânico) - americana. O "novo nacionalismo" se firmava contra as imigrações do "velho mundo" que haviam sido muito intensas na primeira década do século 20. Isso pôs fim à cultura urbana e burguesa na história da civilização norte-americana. Rumo à sociedade pós-urbana-industrial-civil-burocrática houve o engajamento da população trabalhadora na administração e serviços no culto ao crescimento, que resultou inflacionário - o ouro começou a sair dos E.U.A..
Com exceção da agricultura houve declínio na produtividade. Cresceram os subúrbios e a automobilização com rápido declínio do transporte público. Todos os tipos de comunicação se estenderam e estabeleceu-se a indústria nuclear, enquanto a vida privada - pessoal e familiar - do norte-americano colapsava; ao mesmo tempo em que o padrão estado-unidense influenciava nas sociedades de consumo democráticas da Europa Ocidental. As raízes da expansão imperial norte-americana foram econômicas - o comércio acompanhou a bandeira. O envolvimento econômico do país no mundo acompanhava seu imperialismo materializado na extensão da presença militar e política dos E.U.A. pelos oceanos - o dinheiro é consequência e não causa do movimento das mentes. Não existe o determinismo do homem econômico senão que a união dos empreendedorismos público e privado num "capitalismo do povo" que se iguala ao socialismo estatal, que mantém uma aristocracia de banqueiros e advogados. O automóvel - marca do século 20 - faz do homem senhor do seu tempo, mas não do seu espaço que era limitado por leis contra a imigração, a xenofobia erudita das massas democráticas, a eugenia e também a classe social. A classe média, por exemplo, tinha posse padronizada de comida, roupa e abrigo, diferente da burguesia que é um fenômeno histórico (enquanto aquela é um fenômeno universal e sociológico). Os carros norte-americanos eram os carros de luxo do mundo: cadillac, o lincoln e la salla, pouco abaixo do rolls-royce. Antes da Segunda Grande Guerra era o Ford; depois de 1950 era o alemão Volksvagen; em 1980 os republicanos em apoio à livre iniciativa alavancaram à Chrysler norte-americana.
Para a intelectualidade norte-americana, anti-semitismo era anti-catolicismo. Depois de 1945 ser católico não era mais problema porque era sinônimo de anti-comunismo. Em 1953, surgiu a revista Playboy. Em 1960, John Fitzgerald Kennedy, nacionalista, favorável ao desenvolvimento do Estado de bem-estar social, com tendências liberais, tornou-se o primeiro presidente católico dos E.U.A..Era acusado de mundanismo (de acordo com Historical Statistic of the United States, em 1920, a Igreja Católica Romana era a terceira da nação, embora o número de católicos fosse de apenas 20%) e modernismo, adepto da fé de ethos, costumes e hábitos de pensamento e não uma moralidade sobrenatural de filosofia tradicional. É dessa época a formação da Escola de Divindade da Universidade de Chicago, na qual os negócios (business) estavam intimamente relacionados à moral. Em 1963 uma onda de pornografia norte-americana se fez notar. Em 1964 o texano Lyndon Johnson criou a "grande sociedade" estendendo direitos civis e eleitorais a negros e minorias. A partir de 1965, a erosão do dólar e a produtividade começam a declinar. Surgem problemas sociais e crises raciais; aumentam as taxas de criminalidade, mas o acesso ao dinheiro é fácil. O casamento ainda é um ideal, mas a criação dos filhos, os padrões de consumo doméstico e social não pertenciam mais a padrões internos do casamento. Mulheres casadas saem em busca de emprego fora de seus lares, resultado do enfraquecimento das ideias burguesas. Os E.U.A. entram em guerra contra o Vietnam até 1968, data do Festival de Woodstock. No ano seguinte o programa espacial dos E.U.A. vai à Lua.
Com a década dos 1970s começa o fim da prosperidade norte-americana - fim do lastro ouro estado-unidense, o fim do New Deal e é aprovado o direito de aborto. O ex-ator de Hollywood, Ronald Reagan assume a presidência dos E.U.A. nos 1980s; 200 anos depois da fundação do Estado norte-americano, a comunidade nacional de caráter essencialmente anglo-saxão e anglo-ceuta declinou, sobrevivendo apenas dentro das mais resistentes instituições da República, devido às ondas de imigração, enquanto em 1900 as cidades possuíam em média 40% de estrangeiros. A "religião-cívica" norte-americana da igualdade democrática e os puritanos da igualdade humana e educação passam a conviver com a cultura intelectual norte-americana à esquerda da política e do modernismo monopolizada pelos liberais e marxistas, que fazem dela a mudança da sociedade produtiva para a sociedade intelectual-administrativa. A inteligência cede lugar à burguesia e seus acessórios: eletrodomésticos e carros, patrocínio das artes, entretenimento formal e deveres sociais, assumindo a boa administração doméstica, e a responsabilidade pela domesticidade. Nas palavras do espanhol Ortega y Gasset, o mais importante filósofo conservador do século 20, "a civilização burguesa é a única que contém a noção de civilização como a conhecemos" (in "A rebelião das massas"). E assim, forma-se o estilo norte-americano, representado, no século 20, pelo expressionismo-abstrato na pintura, a pictorização (subcultura, enquanto sistema de significados partilhados com a cultura popular e com os significados da cultura em geral), o rock-and-roll, Lloyd Wrigth na arquitetura e Norman Rockwell na ilustração, entre outros.
No. 6
Multidão e democracia no mundo do espetáculo. O espetáculo talvez seja o único espaço negociado em que a multidão é esperada como tal, mesmo que ela assuma, na condição de público, aspectos de unidade que não lhe pertencem.
Na tradição da teoria política somente o "uno" pode governar, seja o monarca, o Estado, a nação, o povo ou o partido.
Monarquia, aristocracia e democracia são as três formas de governo, tradicionais, que constituem a base do pensamento político europeu antigo e moderno. Este princípio do pensamento político, segundo o qual só o uno pode governar, solapa e nega o conceito de democracia. neste sentido, a democracia, assim como a aristocracia, é apenas uma fachada, pois na realidade, o poder é a monarquia. Somente o uno é soberano, afirma a tradição. A alternativa é absoluta: soberania ou anarquia.
No pensamento europeu, essa insistência no uno frequentemente se caracteriza como continuidade do legado de Platão. O uno é o alimento ontológico imutável, ao mesmo tempo origem e télos, substância e comando. Essa falsa alternativa entre o governo do uno e o caos é com efeito reiterada em várias permutações através da filosofia política e jurídica européia. A multidão não é um corpo social porque a multidão não pode ser reduzida a uma unidade e não se submete ao governo do uno.
Carl Schmitt (1985) é o filósofo moderno que mais claramente colocou o caráter central da soberania para a política, renovando as primeira teorias europeias modernas de soberania absoluta articuladas por autores como Hobbes e Jean Bodin. O soberano é definido positivamente como aquele acima do qual não existe poder e que, portanto, é livre para decidir, e, negativamente, como o que é potencialmente eximido de todas as normas e regras sociais. O conceito tecnológico-político de "Estado total" enunciado por Schmitt, que coloca a soberania acima de toda outra forma de poder, como única possível fonte de legitimação, desenvolve a concepção moderna de soberania em direção a uma forma coerente com a ideologia fascista. Schmitt polemizou duramente na Alemanha de Weimar contra as forças do pluralismo liberal e parlamentar, que, para ele, ou bem negam ingenuamente o domínio do soberano (anarquia), ou bem mascaram o soberano por trás do jogo de forças plurais, solapando suas capacidades. A teoria da moderna soberania em política (sujeito político unitário) se harmoniza com as teorias e práticas capitalistas da gestão econômica. deve haver uma figura unitária que possa assumir a responsabilidade e decidir no campo da produção, não só para que haja ordem econômica, mas também para que haja inovação. Ao excepcionalismo soberano corresponde a inovação econômica como forma de governo industrial.
A soberania tem dois lados. O poder soberano não é uma substância autônoma e nunca é absoluto, antes consistindo numa relação entre governantes e governados, entre proteção e obediência, entre direitos e obrigações. É necessariamente um sistema dual de poder. O soberano também é obrigado a negociar uma relação com os governados e solicitar seu consentimento no terreno econômico. Na sociedade capitalista - diziam Adam Smith e David Ricardo - o trabalho é a fonte de todas as riquezas. O trabalho, dizia Marx, é antagônico ao capital e representa constantemente uma ameaça à produção, através das greves, da sabotagem e outros subterfúgios, mas o capital não pode dispensar o trabalho. Nada pode sem a sua produtividade. Sem a participação ativa dos subordinados, a soberania desmorona. O outro lado, segundo Negri e Hardt (2005), é o bio-poder, tendência da soberania para tornar-se poder sobre a própria vida, quando o poder político já não se orienta simplesmente par a legislação de normas e a preservação da ordem nas questões públicas, devendo promover a produção de relações sociais em todos os aspectos da vida.
O poder soberano não deve apenas dominar a morte, mas também produzir vida social. Por outro lado, a produção econômica torna-se cada vez mais bio-política, voltada não só para a produção de bens, mas em última análise para a produção da informação, comunicação, cooperação - em suma, a produção de relações sociais e de ordem social. Assim é que a cultura vem a ser diretamente um elemento tanto da ordem política quanto da produção econômica.
Quando a multidão finalmente se torna capaz de governar a si mesma, a democracia é possível. A democracia da multidão precisa de uma "nova ciência", ou seja, um novo paradigma teórico para enfrentar esta nova situação.
No. 7
Polissemia das práticas. O caso chinês. Essa reflexão sobre coleções de arte e mercado tenta alcançar as discussões sobre polissemia das práticas associada à dotação de novos significados dentro da tradição ocidental moderna, ancorada nos subsídios do Museu Histórico Nacional, numa conjuntura marcada pela passagem dos produtores a consumidores, contexto no qual o mercado de arte é espaço privilegiado do ceticismo.
Neste novo mercado os profissionais - compradores e vendedores - são poderosos e imprescindíveis mediadores que definem não apenas as identidades, mas as disputas e fluxos de objetos, as histórias de vida de artefatos e pessoas não só no mercado primário como no secundário (de revendas) de valores históricos - científicos - estéticos consolidados ou em vias de consolidação.
Antropologicamente, identidade é construção, desconstrução e reconstrução relacionais. Para Appadurai (1986), a circunstância histórica dos objetos é obtida nos objetos mesmos, através da inscrição de significados em suas próprias formas, usos e trajetórias. São as coisas em movimento (things-in-motion) que se caracterizam como bens cuja classificação se modifica a cada particular contexto de suas vidas sociais. A percepção deste movimento decorre da relação da biologia cultural de bens específicos com a história social de um tipo de coisa, o que requer o exame da trajetória total do objeto de sua produção a cada tipo de consumo. Nesta trajetória o cruzamento de fronteiras culturais e sistemas de significado formam o regime de valor em consonância com a concepção ampla de mercadoria. A demanda seria uma função de práticas e classificações sociais e não uma resposta a desejos e necessidades. Essa função está intermediada por mediadores e formadores de gosto.
Incluem-se neste recorte os bens de luxo e sua correlata expertise, os serviços nas complexas sociedades capitalistas validados no universo das coleções. A elucidação das histórias de vida dos objetos é dada por sua dimensão processual, leilões e feiras de arte - seus espaços sociais por excelência, intra e entre unidades culturais que legitimam estes relacionamentos, mesmo que considerados inadequados em outros contextos. A reunião de diferentes sistemas culturais onde um mínimo de entendimento dos bens em questão é compartilhado, acorda apenas com os termos do negócio. A biografia dos artefatos é múltipla em funções e papéis que podem se dar em contexto cultural razoavelmente homogêneo para indivíduos que se apropriam deles e movem-se simultaneamente por necessidades e prioridades distintas, não necessariamente relacionais. Portanto, a polissemia das práticas não precisa estar estabelecida por distintos agentes sociais que dominam códigos simbólicos diversos de objetos para datá-los de um determinado sentido, como exemplifica Veiga (2012) "as baixelas de prata do universo curial europeu no século XVIII.": a partir de 1726, D. João V e a corte portuguesa recorriam às oficinas francesas (Germain) para sua prataria civil, cujo uso ritual era ditado por Versailles (codificação observada por seus aliados e adversários). Hábil ourives da época, embora fosse arquiteto, foi recomendado por D. Luis da Cunha a D. João V. D. José I, encomenda a ele a reposição da baixela dos Braganças em quatro cobertas que ele não pôde completar por falência, gerando, esta falta, comentários (de que se têm registro) entre embaixadores e o guarda-jóias da coroa, que demonstraram como o luxo, no século 18, era já polissêmico. A prataria Germain é um dos orgulhos do patrimônio lusitano e continuou a ser utilizada em Portugal nas recepções republicanas. Os objetos seguiram sua carreira no serviço de festas e cerimônias públicas do governo. Em 1926, o Museu Nacional de Arte Antiga conseguiu 300 objetos da baixela Germain para seus acervos. Os demais objetos da baixela continuam sua carreira de bens utilitários de luxo nos atos oficiais no Palácio da Ajuda.
A polissemia simbólica fica clara na disputa por criações, procedências, colocando a definição da leitura correta de seu significado no centro do embate público tanto quanto os próprios bens. O virtuosismo semiótico desse tipo de contenda evidencia a prioridade dada à economia, à política e à cultura em cada caso.
Não há sociedades monoculturais no mundo pós-modernidade, da fragmentação, do multiculturalismo, da concepção de identidades baseadas no nacional e no classista. A postura chinesa quanto à complexidade polissêmica e à restituição de patrimônio perdido afeta a classificação de arte, que restringia-se a poucas manifestações resultantes de um longo e exigente aprendizado intelectual, com supremacia da pintura, da caligrafia e da poesia. Essas "três perfeições" (san jue) representam o máximo da estética clássica chinesa. Essa arte estava voltada a um grupo específico do Celeste Império: os letrados, que integravam sua elite dirigente; enquanto membros da elite dirigente , os artistas compartilhavam seus valores e criavam para os seus pares. A estética chinesa passa a sofrer influência das preocupações da arte ocidental. A arte contemporânea chinesa diz respeito a um duplo deslocamento artístico e de inserção social de seus criadores o que tem que ser entendido enquanto novo investimento simbólico exemplificando o exercício da polissemia.
Em 2009, o mercado de leilões chinês alcançou 3,2 bilhões de dólares quando em 2004 eram 1,1 bilhão, sob supervisão constante do Center of International Cultural Exchange, órgão que cuida da administração estatal da herança cultural chinesa, responsável, inclusive, por inspeções no exterior, ação acusada pela imprensa norte-americana de nacionalista e escamoteadora das tensões entre a ideologia marxista e a lógica das forças de mercado.
O comportamento dos novos compradores chineses apresenta constantes. Além das cívicas restrições patrimoniais desprovidas de referências básicas dado o contexto sócio-político em que foram criados, os novos miliardários chineses buscam formas e caminhos confiáveis de diversificação de seu portfólio para constituírem uma identidade pública que lhes permita oferecerem gratificações estéticas associadas a fruição pública de suas fortunas e a posse de bens históricos chineses no mundo pós-Mao. Suas compras não estão restritas às obras ligadas a seus pais. Não demonstrando, entretanto, interesse pelos old masters europeus. Sua atuação é ativa nas casas de leilões como compradores que garantem a maior e mais lucrativa possibilidade de expansão dos negócios.
Os mais fabulosos ricos do mundo estão na China. Em suas compras estão a marca imperial das peças e a procedência de coleção ocidental (ou japonesa), que nem sempre tem como prioridade à autenticidade. O cruzamento entre ambas é decisivo. O que imprime desejabilidade aos objetos são as fases da carreira passada dos bens. Compram-se assim ideias e valores sob a forma de símbolos. Os bronzes arqueológicos, por exemplo, deixaram de ser práticas sacrílicas dos ancestrais e morte para virem compor as coleções chinesas, mudança de mentalidade introduzidas por Hong Kong e Taiwan.
A virada do século 20 para o 21 foi marcada por novas carreiras aos objetos, resultado de novos enquadramentos estéticos e novas concepções da história da arte decorrentes das novas tecnologias de comunicação e informação como vetores: a bricolagem virtual, a propriedade intelectual, a pirataria digital, redefinições do público e do privado. Além disso, o mercado secundário (leilões) toma a dianteira sobre o mercado primário de compradores e vendedores no mercado de arte, transformando os grandes pregões públicos na mediação por excelência para a formação das coleções de arte e para as carreiras e importância dos colecionadores, inflacionando os preços destes bens, instituindo uma comunidade concreta de troca entre pares privilegiados. Assim, na primeira década do século 21, o mercado de arte foi escandalizado por uma nova categoria de sub-colecionadores que assumem o primeiro plano no mundo da arte e passaram a ser cortejados por leiloeiros e marchands. Dentre eles Ronald Lauder, herdeiro da empresa de cosméticos Estée Lauder e a compra de um Gustav Klimt; o bilionário da indústria de entretenimento David Geffen (ex-sócio de Steven Sprelberg) adquiriu um Jackson Pollock; a compra de um Kooning pelo bilionário de fundos hedge (fundos que adotam estratégias não tradicionais) Steven Cohen.
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A reorganização de Wall Street originou as fortunas atuais que compartilham seu prazer estético em exposições. É forma de expressão das casas de leilões que se "conquista" uma obra. A arte como investimento sério pressupõe na compra de opções futuras do significado cultural de um obra, sem esquecer que o investimento em arte contemporânea requer compras de renovação do estoque antigo, sem perder de vista as diferenças entre colecionadores, comerciantes e acumuladores e suas intenções e práticas.
No. 8
Pluralidade cultural alemã e América. Na descoberta do "Novo Mundo" os alemães estavam atentos - à cartografia e comércio. A mais antiga representação do globo terrestre é do século 15 e o autor foi o alemão Martin Behaim. O famoso mapa-mundi de outro Martin, Waldseemüller, em 1507, utilizou os relatórios de viagem de Américo Vespúcio e chamou o novo continente "América". Talvez ninguém lembre o cartógrafo, mas o nome ficou. O primeiro mapa que detalha a costa brasileira, datado de 1515, é de autoria do cartógrafo alemão Johann Schöner. Depois do Tratado de Tordesilhas (1494), o importante empório da família Weiser em Augsburg, no sul da Alemanha, estabeleceu-se com uma filial em Lisboa (1503) para criar laços comerciais com o Novo Mundo. Em 1519, os banqueiros Weiser e Fugger subsidiaram maciçamente a eleição de Carlos de Habsburgo para imperador do Sacro Império Romano de Nação Germânica, que foi coroado imperador alemão com o título de Carlos V ao tempo rei da Espanha. Pela ajuda financeira foram recompensados com privilégios nas colônias espanholas. Os Weiser também foram contemplados com uma feitoria em Santo Domingo e uma donatoria na Venezuela onde, inclusive, plantavam cana-de-açúcar e mantinham minas de cobre instaladas nos moldes alemães, o que trouxe 50 mineiros da Saxônia e suas mulheres, sendo o primeiro empreendimento do gênero na América. Nikolaus Federmann, de Ulm, escreveu um dos primeiros relatos detalhados sobre a região norte da América do Sul e participou da fundação de Bogotá (1539). Entretanto, começaram disputas entre o catolicismo e o protestantismo. Os privilégios dos Weiser terminaram em 1544, quando o conselho das Índias decidiu nomear um governador espanhol para a colônia. Os Fugger receberam a donatoria em Chincha Alta, no Peru e o estreito de Magalhães (1531). Além desses, tornaram-se conhecidos Hans Staden e Ulrich Schmidel, que presenciou a fundação da cidade de Assunção. Ambos publicaram sobre suas experiências causando grande sensação na Alemanha, onde a imprensa tipográfica era mais desenvolvida em decorrência da notável invenção de Guttemberg (1450). A primeira tipografia na América Latina foi instalada pelo alemão Jacob Cromberger que publicou no México a partir de 1539.
Importantíssimo para as relações entre a Alemanha e a América do Sul foi a chegada ao Novo Mundo dos jesuítas alemães a partir do final do século 16, radicados nas reduções entre os rios Paraguai e Paraná, com o intuito de missionar e civilizar a grande população de índios nômades. Além de dedicarem-se a vários setores, cultivavam habilidades sofisticadas como a fundição de sinos e a construção de instrumentos musicais. Criaram hospitais, escolas e oficinas. A primeira farmácia argentina foi criada por um padre alemão na cidade de Córdoba (1698). Os jesuítas muito contribuíram para a desmistificação da América Latina na Europa e para a valorização da cultura indígena. Entre estes acontecimentos e a Feira do Livro de Frankfurt de 1976 (primeira edição) passaram-se mais de 300 anos. Naquela Feira a literatura latino-americana foi escolhida como o tema central, colocando autores como Ángeles Mastretta (1949, México), Isabel Allende (1942, chileno/norte-americana), Jorge Luis Borges (1899-1986, argentino), García Marques (1927-2014, colombiano) e Mário Vargas Llosa (1936, Peru, Nobel de Literatura em 2010), por muito tempo na lista dos mais vendidos na Alemanha.
Os museus e galerias alemães se encheram das figuras gigantescas do figurativista Fernando Botero (1932, Colômbia) ou do neofigurativismo de José Luis Cuevas (1934-2017, México, premiado na V Bienal de São Paulo), Jesús-Rafael Soto (1923-2005, Venezuela) com seu abstracionismo geométrico e arte cinética, a escultora Alicia Penalba (1913-1982, Argentina), e a surrealista Frida Khalo (1907-1954, México). Kassel sedia a cada 5 anos os principais expoentes da arte contemporânea. São também valorizados o cinema e a música na maratona de consertos de Colônia.
A estrutura federalista é marcante na vida cultural alemã, cuja pluralidade se manifesta na distribuição regional de diversas instituições e atividades culturais na Alemanha, como a Biblioteca Alemã (entidade federal). As entidades culturais na Alemanha são em grande maioria mantidas pelos municípios e comunidades. Os Estados legislam sobre o setor cultural. A mídia é assunto correlato, mas à parte. Além da estrutura organizacional interna da Alemanha, existem organizações culturais medianeiras de coordenação e intercâmbio cultural internacional, resultado de acordos culturais que são financiados pelo orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Os mais importantes são o Instituto Goethe, o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD), a Fundação Alexandre von Humboldt, o Instituto de Relações Internacionais e a INTER-NATIONES.
Na literatura alemã da primeira metade do século 20, foram destaques o nobel de literatura (1929)Thomas Mann, o expressionista Gottfried Benn e o dramaturgo Bertolt Brecht. Depois da Segunda Guerra Mundial houve uma tentativa de parte dos escritores de fazer a experiência chocante da guerra e da destruição, apoiando-se para isto em exemplos estrangeiros ou no modo de pensar existencialista ou de tradição cristã, o seu tema. Essa tendência consiste em não debater a questão política, mas em fazer reflexões sobre a culpa do alemão e sua derrota por meio de símbolos religiosos ou retirados de uma visão de mundo, recorrendo frequentemente ao modernismo literário proscrito por 12 anos. Exemplificam essa tendência o drama de W. Borchert, os contos de H. Böll e de A.Schmidt, a lírica de Paul Celan, de Günter Eich e de Peter Huchel. Nos anos 1950-60 o tema literário era o confronto com o passado recente, a crítica ao "milagre econômico", a rápida construção de um novo bem-estar material, presente nos autores alemães W. Koeppen, H. Böll, S. Lenz e o nobel de literatura (1999) G. Grass. Central foi o Grupo 47, agrupamento informal de escritores de língua alemã iniciado por Hans Werner Richter que realizaram até 1967 encontros literários cada vez mais politizados, cujos integrantes viam-se como uma instância moral. Seu representante mais proeminente, Heinrich Böll recebeu o nobel de literatura em 1972. menos preocupados em interpretar a realidade do que em descrevê-la sem emoções havia outra ala da qual faziam parte J. Becker, R. D. Brinkmann, A. Kluge (pós-modernista, um dos mais importantes intelectuais alemães contemporâneos) e D. Wellersholf. Contrapondo-se a estas tendências está a poesia concreta que abstrai conteúdo para transformar a linguagem em literatura: M. Bense, E. Gomringer, H. Heissenbüttel, Franz Morin. A geração revoltosa de 1968 trouxe tendências esteticistas da literatura que, de acordo com a crítica, dissimulavam causas sociais e econômicas da estrutura da economia consideradas injustas, levando muitos autores a procurar o engajamento político, que conduziram também à busca de novos papéis e novas formas de literatura cujas expressões mais radicais são a tese da "Morte da Literatura", de Hans Magnus Enzensberger (Prêmio Príncipe de Astúrias em 2002) ou a "Estética da Rebelião" de Peter Weiss. Soma-se a essa literatura política o teatro documental - Rolf Hachhuth e Heinar Kipphardt - que se liga em conteúdo e intenção ao gênero reportagem partidária, como em Günter Wallraft e da literatura do mundo trabalhista. Junto a estas tendências alguns individualistas impuseram-se como autores centrais na sua época, como foi o caso de A. Schmidt, através de sua exposição séria e irônica subjacente ao "ser intelectual" num mundo de indiferença e ausência de espírito do ceticismo de Schopenhauer que lhe conferiu agudeza à visão do trágico e do cômico da existência humana.
Num balanço da produção literária do pós-guerra até o fim do socialismo real existente na R.D.A. de 1989/90 e na União Soviética de 1991, a década de 1950-60 chega ao esgotamento por falta de originalidade e agudez de pensamento enquanto a geração de 1968 passou a se expressar através de performances, música e filmes.
Destacaram-se neste balanço crítico Marcel Reich-Ranicki (o "papa da literatura") e o judeu Victor Klemperer. A literatura na R.D.A. tomara um rumo diferente da ocidental, pois não havia liberdade de informação e opinião e as restrições eram muitas, pois o país houvera doutrinado pela ideia literária soviética do "realismo socialista".
Até 1961, a alternativa era a fuga como fez Uwe Johnson. Portanto 1950-60 foi dominado por uma literatura conformista, banal, sem inovações ou debates com a vanguarda do século 20, que, inclusive era proibida, assim como as correntes filosóficas contemporâneas. Ausentes Franz Kafka, James Joyce, Samuel Beckett, Vladimir Nabokov e mesmo Friedrich Nietzsche, formou-se a mediocridade oriunda da uniformidade ideológica. Deste período sobressaíram-se apenas Heiner Müller e Christa Wolf, apesar de seguirem presos ao amago socialista. mesmo a crítica dentro das obras literárias era esporádica e comedida. A literatura da R.D.A. teve a particularidade - dentre os países do Leste Europeu sob o domínio soviético - de ter sido predominantemente afirmativa. No período do pós-moderno de Botho Strauss, destacou-se por empreender em seus contos e romances a tentativa séria de apreender a face insondável do presente na linguagem e em sequências cênicas, através de quadros místicos.
A década de 1990-2000 ainda requer distanciamento para que o fim da divisão política e ideológica da Europa e da Alemanha possa ser trabalhada literariamente com fatos históricos tão importantes e permita uma resposta sobre de que modo influenciaram ou modificaram a literatura alemã. Surgiram alguns casos, até premiados, mas a filosofia do pós-guerra na Alemanha foi de profunda cisão e prolongada insegurança. Martin Heidegger (1880-1976) que embasou o existencialismo transformou-se em um dos intelectuais mais controvertidos do pós-guerra por sua temporária aproximação do Estado nazista de forma demonstrativa. Seus princípios existencialistas continuam sendo determinantes e suas teorias foram desenvolvidas por Karl Jaspers, Hans-Georg Godamer, Karl Löwith e Jean-Paul Sarte, na França.
A corrente filosófica ligada ao positivismo desenvolveu-se nos países anglo-saxônicos representada, apesar das divergências, por Ludwig Wittgenstein, Rudolf Camap ou Karl Popper pela tradição da filosofia linguística e da filosofia analítica e teve em Wolfgang Stegmüller o representante mais influente na Alemanha.
A partir de 1960 cresceu a influência da Escola de Frankfurt: judeus e filósofos de tradição marxista que deixaram a Alemanha no período nazista. A "teoria crítica" que marcou sua época voltou-se tanto contra a tradição conservadora e a política dos adeptos do existencialismo como contra a tendência do positivismo de reconhecer a situação existente como determinada pela natureza.
Na década de 1970 a filosofia alemã abriu-se para a tradição anglo-saxônica, enquanto esta última absorvia progressivamente impulsos do pensamento europeu continental. A filosofia de Jüngen Habermas é uma tentativa de reunir elementos significativos da filosofia continental do ocidente com componentes anglo-saxões e assegurar os valores com caráter geral de validez e a ligação estreita com a facticidade, no que se diferencia do sociólogo Nicklas Luhmann que acentua o sentido autônomo do desenvolvimento de sistemas como a sociedade, a economia e a política.
A produção de livros da R.D.A. ocupa o terceiro lugar no mundo, depois da Inglaterra e da China.
As cidades que são mais importantes centros editoriais são Munique, Berlim, Frankfurt do Meno, Stuttgart, Colônia e Hambuergo.
Não há editora com domínio de mercado.
A ideia da educação popular, no pós-guerra, fez com que novas camadas de leitores fossem conquistados pelos clubes de livros. O Grêmio de Livros Guttenberg, por exemplo, foi fundado por sindicatos.
O mercado livreiro, ao lado do farmacêutico, é o único setor da economia alemã onde a lei permite o tabelamento dos preços de venda ao consumidor já na entrada do século 21, garantindo o amplo abastecimento da população com o bem cultural livro.
A Feira do Livro de Frankfurt, realizada todos os anos em outubro, é a principal e é um acontecimento internacional no ramo livreiro onde uma grande porcentagem das vendas mundiais de licenças e direitos autorais ocorre.
Em 1976, introduziu-se na América Latina a ideia de prestar uma homenagem especial a continentes e países. Em 1994, o Brasil foi o tema. O ponto-alto da Feira do Livro é a entrega do Prêmio da Paz do Comércio Livreiro Alemão.
A segunda maior Feira do Livro, em importância, é realizada em Leipzig, na primavera setentrional, que funciona especialmente como intermediária em relação aos países do Leste Europeu.
A Alemanha não possui uma biblioteca nacional centenária. Em 1913, a Biblioteca Alemã de Leipzig começou a colecionar todos os escritos em língua alemã. Em 1947, a Biblioteca Alemã de Frankfurt do Meno assumiu as mesmas funções desta no Oeste. Ambas foram fundadas pelo comércio livreiro e tornaram-se instituições federais em 1969. Em 1990, ambas foram reunidas.
A partir de 1930, muitas bibliotecas foram fundadas, inclusive universitárias, algumas como a Herzog August, de Wolfenbüttel, contendo 12.000 manuscritos medievais. As bibliotecas alemãs são mantidas, principalmente, pelos municípios e pelas igrejas.
http://www.buchhandel.de.
Para acompanhar a heterogeneidade dos países em alcançar "seu" desenvolvimento, introduziu-se o papel das organizações e das instituições naquelas experiências, mesmo diante de modelos de mundo competitivo ideal sem instituições e com mínima interferência no estabelecimento de mercados eficientes. A estrutura de incentivos da sociedade - os incentivos são fundamentais ao processo de mudança, portanto ao desenvolvimento - é função da estrutura institucional da sociedade. As instituições são humanamente idealizadas e formatam a interação humana formal e informalmente. O desempenho econômico é determinado justamente por essas constituições, leis, regras, regulações, normas de comportamento, convenções e códigos de conduta auto-impostos. O que foi avivado pela economia neoclássica nesta segunda geração foram os aspectos de ação coletiva, poder de negociação, capacidade estatal e processos políticos que haviam sido ignorados.
Uma economia em desenvolvimento é uma economia em processo de mudança o que requer um alto nível de "capacidade social", pois estas mudanças vão intervir nos acordos sociais através dos quais as pessoas são induzidas a cooperar e participar na atividade econômica para atingir seu desenvolvimento potencial.
Para alguns economistas como Paul Collier (1998) "capital social" é a coerência social e a cultura interna da sociedade. São as normas e os valores que governam as interações entre as pessoas e também as instituições das quais estas pessoas fazem parte. Quando uma interação social gera externalidades - neste caso confiança e lealdade são exemplos, pois têm valor real e prático incrementando a eficiência do sistema permitindo produzir mais bens (valor econômico) que mantenha a alta estima, sem que sejam mercadorias para o mercado aberto do comércio técnico - e facilita a ação coletiva por benefícios mútuos fora do mercado o capital social obtém um retorno econômico.
Condicionantes da interação dos agentes e geradores de externalidades definem o "capital social civil" de que são exemplos a confiança, a reciprocidade, as redes interpessoais, a cooperação e a coordenação.
O "capital social governamental soma a estes os benefícios da lei (força do contrato), da ordem, dos direitos de propriedade (segurança), educação, saúde e "bom governo" (efetividade das burocracias públicas). A ênfase sobre o capital social (ou cultura, instituições e padrões de comportamento) deveria embasar a explicação do processo de mudança dentro de um esforço multidisciplinar com conexões mais fortes entre economia do desenvolvimento, nova economia institucional e nova sociologia da economia.
O que a história do desenvolvimento econômico ensinou coincide com o que afirma Max Weber: a cultura faz toda a diferença. Entretanto, o temor acadêmico esbarra na carga que a cultura passa a ter de racismo, hereditariedade e imutabilidade - as origens das crenças culturais - tocando o ego e afetando a identidade e a autoestima.
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Neste momento entra em cena a habilidade de usar o conhecimento para dar forma às pessoas e às coisas, o que implica em elevada passividade na observação que se coloca entre a condescendência e o distanciamento prudente.
A primeira geração de economistas do desenvolvimento do pós-guerra deu preponderância à cultura como facilitadora ou restritora do crescimento econômico, como é o caso dos judeus e calvinistas por toda a Europa - minorias expatriadas com impacto sobre as respostas das sociedades da modernização da vida comunitária e das possibilidades do desenvolvimento econômico nacional, afetando inclusive a reputação das economias que fazem sérios esforços por incorporar variáveis culturais.
A atenção à cultura está relacionada ao desenvolvimento institucional - instituições fortes, respeitáveis e de representação efetiva com governabilidade e consequente crescimento econômico.
A política governamental tem resoluções normativas. Isso é consequência da teoria positiva da nova economia política (neoclássica) na qual o governo endogeniza o desenho das políticas num "paradoxo de determinância" e na definição da forma como a política econômica do bem-estar deva ser conduzida. Outros elementos de psicologia social podem intervir na tomada de decisão, assumindo que é impossível uma caracterização universal simples do comportamento político quando o Estado unitário cede á agregação de preferências. A nova economia política implica num Estado mínimo, em países em desenvolvimento, reapresentando a questão relacional entre liberdade e desenvolvimento, cujas conexões empíricas e conceituais são discutidas por Amarthya Sen (1999). Quando o tema é o desenvolvimento é básico reconhecer que as liberdades são tanto o objetivo básico como seu meio principal. Enquanto objetivo não pode estar dissociada da vida cotidiana como desfrute real. Para seres humanos responsáveis importa a liberdade para fazer o que pensam que tenha valor e não em termos de melhorar as condições de vida de objetos inanimados. Além dessa conexão constitutiva reconhecida através da análise empírica das consequências e interconexões de diferentes tipos de liberdades e a evidencia de que esta diversidade tipifica a sustentabilidade de outras liberdades, funciona como agência motora do desenvolvimento, por sua relevância e papel consequente. A questão da liberdade social em Sen (indiano) é de tal importância que ele a denomina oportunidade social, ou seja, as liberdades que o Estado e a Sociedade permitem, como possa ser a educação pública para mulheres enquanto libertadora das restrições do analfabetismo e da ignorância, que além de ser valiosa em si mesma contribuem ao desenvolvimento econômico, ao uso mais compartilhado dos mecanismos de mercado e ás liberdades específicas resultantes da prosperidade econômica, no longo prazo. É o "progresso da razão" palavras do matemático francês Concorcet, pensador da ilustração, seguido por Malthus. Para Sen, "la idea del desarrollo basado en la libertad captura el papel constructivo de seres humanos libres (...)" (2002).
(sobre Teoria do Desenvolvimento ler também coluna do Coreconrs no Jornal do Comércio de Porto Alegre de 14-15-16/09/2007, entrevista do economista, doutro e professor da PUCRS, Nali de Jesus de Souza)
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Vista aérea do Mercado Público de Porto Alegre |
Comerciar. As feiras eram um espaço típico de comércio, nas quais se organizavam os mercadores emitindo letras de câmbio que tinham bancos específicos para serem resgatadas. Além de venda a crédito, faziam empréstimos a juros, obtendo lucro e aumentando seu capital. Surgiram "compagnie" de mercadores da Alemanha e França, numa nova organização do trabalho. Cada local era mais propício do que outro para os negócios e os produtos, em sua origem, indicavam especializações. Dentre as feiras, a de Veneza sempre foi atrativa. A cidade era famosa por seus vidros, suas especiarias, essências de cravo (água nanfa) e sedas. As trocas comerciais eram feitas através da moedagem corrente: soldos (moeda romana de ouro), denários (moeda de prata romana), denários viennesi, denários sterling, denários colonesi, ...O horário era o da jornada ("ora prima", "tercera hora", "vésperas", etc.) e a única língua universal era o latim, usado pelos homens da Igreja ou eventualmente algum nobre. As populações falavam idiomas e dialetos de origem francófana, germânica ou franco-normanda. Assim era em 1200 d.C.. Muito tempo se passou enquanto o comércio com o Oriente se intensificava e a monarquia se consolidava na Europa incentivando as ciências e as artes com a criação de academias: de Belas Artes, em Roma; de Ciências, Arquitetura e Música, em Paris, onde os franceses alcançavam beleza e grandeza raciocinando. Os poetas e artistas iam à Corte aprender sobre a cidade no ambiente político dos espíritos cultivados, onde os literatos se entretinham com a estética e a retórica.
O sistema equitativo - sensível às novas exigências - se impõe sobre o sistema tradicional sobre o qual elabora e sistematiza novos princípios que eram de exceção e passam a ser de aceitação comum, fazendo com que acepções distintas e contrapostas progressivamente se fusionem.
O direito de comerciar historicamente é um direito de normas e princípios, especial, originariamente aplicado em âmbito particular que, com o desenvolvimento histórico sucessivo encontra aplicação mais vasta de acordo com o desenvolvimento das relações econômicas e sociais até se constituir em direito comum, porém especial e autônomo quanto às suas obrigações.
Na América Latina, os direitos civis e do comércio derivam dos sistemas romanísticos da Europa continental subordinados ao direito privado. Entretanto, não é o direito da administração e produção de riqueza. Também não abrange a atividade agrícola. Não é o direito de circulação. Não é o direito de intermediação, nem o das empresas. Está sim relacionado a um tipo de produção de grande escala, unificando, desta forma particular, as obrigações da lavoura, do comércio e da indústria.
A fratura entre o direito romano canônico das comunas (comunidades de caráter igualitário criadas com objetivos econômicos e políticos, eram cidades autônomas governadas por mercadores ricos, voltados à defesa de seus habitantes - comerciantes e artesãos. O senhor destas cidades era um bispo ou barão e sua autonomia se dava por revolta ou compra desse direito) italianas no século 12 e as exigências econômicas sob elas impostas que resultaram no que atualmente denominamos capitalismo, originaram o direito de comércio. Inicialmente transmarino e bancário, continha exigências ausentes de liberdade de iniciativa e de concorrência num mercado livre. Liberado dos vínculos da sociedade feudal, alcançou também a atividade industrial. Sua evolução está embebida da ideia de mercado e este dos institutos do seguro (originalmente marítimo) e do empréstimo a risco. Sua autonomia não se prendendo aos direitos estatais estava assentada no consentimento e no costume dos interessados, sucessivamente consolidados nos usos medievais de jurisdição consular particular, muitas vezes contraposta à jurisdição geral comunal.
A renascença do comércio e da vida econômica exigiu um sistema contratual de complexidade e elasticidade com cunho formalístico no princípio da obrigatoriedade vinculada a determinados contratos como fonte exclusiva, permitida a liberdade de formas. Restabelecidos o comércio, as comunicações e o hábito de escrever, inova-se com a conclusão dos contratos entre ausentes, superando os textos romana os clássicos em seu domínio do contrato entre presentes e o contrato verbal. os canonistas vieram em socorro com suas premissas éticas pelo valor do consentimento em favor do contrato escrito e do contrato entre ausentes.
Um novo elemento - a vontade - do representante/ausente e do agora também representado (outorgante de poderes), frisam a diferença entre abuso e excesso de poder. Esta elaboração teve caráter internacional anterior à constituição dos estados nacionais.
É Benevenuto Stracca (século 16) o primeiro e um dos maiores escritores profissionais do direito de comércio. As primeiras sistematizações legislativas completas dos seguros são catalãs; o português Santarém fez o tratado dos seguros; o endosso é de origem francesa; Flandres impulsionou os negócios da bolsa e José da La Veja (1681) mantém-se atualíssimo; as patentes de invenção começaram no estatuto inglês de monopólios que foram precedidos pelas leis ditadas em Veneza nos séculos 15 e 16. No século 17, com a fortificação dos Estados monárquicos centralizados, estes assumiram o monopólio de legislar sobre o comércio como disciplina real (Luis XIV). Deixa então de ser um direito de classe, mas conserva sua autonomia como direito, passando a influenciar o direito comum, sendo codificado em regras (napoleônicas) comerciais à qualquer ato mercantil, independente da pessoa do agente comercial.
O problema do século 19 - característica fundamental da sociedade moderna - foi o da mobilização do crédito (de curto a longo prazo), não apenas para o consumidor, senão que para o empreendedor (obtenção de grandes capitais) - o industrial e o comerciante, questão diretamente relacionada à circulação de direitos. Assim foi superado o conceito do direito tradicional assente na conexão do direito com o seu sujeito e, elaborada a disciplina de aproximar a circulação dos direitos às das coisas - o direito objetivo.
A codificação brasileira do direito de comércio data de 1850, sendo, portanto, de influência da tradição do direito romano comum dos séculos 17 e 18, manifestando-se no caráter prevalentemente familiar das sociedades anônimas.
Constituíram ponto de partida do direito de comércio, historicamente (1) a mediação - ramo de atividade em que, inicialmente, se manifestaram historicamente as novas exigências; (2) circulação - característica fundamental do sistema econômico e que se foi elaborando quando considerando sua relação com o mercado; (3) empresas - característico desse sistema quanto à organização técnica da produção. Atualmente, é função de muitos institutos do direito de comércio à produção em larga escala, que concerne igualmente à técnica de produção.
A primeira companhia colonial, datada de 1602, a holandesa das Índias, originada pelo interesse pelo Extremo Oriente e presa à colonização do novo mundo recém-descoberto pela Europa do século 17, resultou de uma união (estudada em vários países europeus no final do século 16 e constante de um projeto português não realizado datado de 1587) entre vários condomínios marítimos.
Constituída pela lei especial que a reconhecia, assentou a personalidade jurídica com a separação dos patrimônios e a possibilidade de uma mudança de sócios. independentemente de uma alteração dos estatutos. A responsabilidade limitada do acionista tem origem no direito marítimo quando a companhia holandesa das Índias se formou a partir das várias comunhões de armadores do direito germânico. A função econômica e social destas sociedades anônimas decorre do fato de constituírem um instrumento jurídico para recolher economias em vastas camadas da população, angariando capitais que superam as forças econômicas de indivíduos isolados ou de pequenos grupos que não poderiam, pessoal e diretamente, constituí-la e administrá-la (pela monta de suas economias ou por seus afazeres), mas que, entretanto, são necessários.
A circulação de ações por seu turno, tinha precedente na circulação de títulos das cidades italianas da renascença, quando em um banco como o de San Giorgio em Gênova, debenturistas se reuniram para administrar os bens do devedor. A empresa jurídica dos séculos 19 e 20, já com viva orientação estatal e mercantilista imita o modelo da lei francesa de 1867, oriunda do código napoleônico sancionador de liberdades de constituição das sociedades anônimas, tanto no Brasil como nos países da Europa continental e na América Latina. Se a difusão e circulação de ações entre os públicos, de início, era rigorosamente limitada, tutelada a contratação e pouca discrepância entre as partes, a partir de 1867 chegou-se quase a uma subversão de princípios, o que resultou em duas tendências manifestas: a ideia do patrimônio separado cuja importância levou às anônimas de um sócio apenas e anônimas familiares e à colocação das suas ações no público. Surgem daí os problemas relativos à constituição de monopólios ou oligopólios e do seu contraste com a expansão econômica no interesse de todos, mesmo para os que discordem dos que fazem da clientela objeto de proteção, posto manterem os clientes liberdade de compra e de escolha enquanto consumidores, já que existe liberdade de concorrência.
Aplicada ao mercado internacional levou à aplicação do livre-cambismo, defendido fundamentalmente pela Inglaterra, ansiosa por colocar seus produtos em todos os mercados europeus e coloniais.
As colônias americanas se exaltavam por questões de direito. O que eram puras filosofias nos países metropolitanos de intensa atividade comercial, de vida intensa e trato de gentes variadas, na monotonia das colônias, com a mentalidade inativa dos ali imigrados, eram o suficiente para causar algumas vezes efeitos tão desproporcionais como insólitos, como foi o caso da aplicação das premissas do Contrato Social de Rousseau na América pelo governo de Londres e seus súditos em 1714, o que na França não teve aplicação antes de 1789. Por outra parte, as colônias enviaram a Londres para discutir o assunto a Benjamin Franklin com seu discurso de direitos naturais, dos americanos - os cidadãos ingleses que serão membros do corpo político dos E.U.A., apoiados, então, exclusivamente nos pilares da Constituição.
O liberalismo defendia a mais ampla liberdade individual, o que havia convencido os rentistas, empregados, literatos, advogados e professores de que podiam opinar livremente em religião, moral, legislação, economia política e administração. Além disso, o "laissez-faire" não previa espaço para a ação econômica do Estado que teria como função garantir a concorrência empresarial de maneira livre e o direito de propriedade privada quando esta estivesse ameaçada por convulsões sociais.
No. 4
Arte "Povera" e a soberania do consumidor. Segundo a curadora de arte Ana Zavadil (2014), "Na história da arte, a Arte Povera, ou a arte pobre, foi um movimento dos anos 1960, fortemente inclinado em direção a uma ruptura com a produção artística mais convencional daquele período. Os materiais nobres, usados até então, são substituídos por materiais de baixo valor, geralmente sem utilidade, reciclados ou frágeis. (...) Essa inclinação artística dava mais importância ao processo do que ao produto, o que nos parece familiar nos dias de hoje no momento em que a obra de arte é crítica ou de reflexão e traz um apelo à sensibilidade."
O precário também passou a ser tema na arte, especialmente com o advento do romantismo. É o caso de "Os Miseráveis", de Vitor Hugo em 1862, na literatura; os retratos de doentes mentais e mendigos de Théodore Géricault, no século 19, as histórias infantis contadas pelos Irmãos Grimm, que foram coletadas da tradição oral na região de Kassel, na Alemanha (1812-15).
O cânone da beleza se referia também à escolha de materiais e seus fins. O tamanho também se relaciona com a nobreza e importância do tema.
A partir da Idade Média, em países europeus, os atelies e as guildas - associações que agrupavam indivíduos com interesses comuns (mercadores, artesãos, artistas) em defesa de seus interesses econômicos e profissionais, estabeleciam o modelo para que os artistas se relacionassem com os materiais e técnicas artísticas. Esse conjunto de regras de trabalho resultaria na durabilidade e na continuidade das ideias contidas na obra. A natureza dos materiais era estabelecida por seu valor de troca e raridade.
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John Kenneth Galbraith (1908-2006), economista canadense, filho de escoceses, de postura liberal keynesiana e reformista foi o precursor do Código de Defesa do Consumidor.
Para ele, a circunstância econômica tem uma influência dominante nas atitudes sociais da sociedade pobre, porque para os que são pobres nada é mais importante como a sua pobreza. Entre os pobres, somente a religião tem competido com a circunstância econômica na formação das atitudes sociais.
Citando Marx (1859), "O modo de produção da vida material determina o caráter geral dos processos social, político e espiritual da vida.", no dizer de Marshall (1907), "Aqui e ali o ardor do espírito militar ou do artístico, tem sido, por algum tempo, predominante, mas as influências religiosas e econômicas (...) têm sido quase sempre mais importantes do que todas as outras juntas."
Na sociedade pobre, as considerações econômicas dominam de fato as atitudes sociais, mas também especificam rigorosamente as questões que serão consideradas prioritárias. Estando a necessidade psíquica em paridade com a necessidade física e sendo infinitamente plástica a premência do aumento da produção -, e por conseguinte do problema econômico - não diminui com o aumento do bem-estar. Uma população crescente, e particularmente uma população urbana crescente, aumenta o atrito de uma pessoa com a outra e o gosto necessário para a harmonia social. É razoável supor que uma proporção crescente das necessidades de uma comunidade cada vez mais civilizada encontra-se por sua natureza no domínio público, e que no Estado moderno há cessão da soberania do indivíduo ao produtor ou à organização. Há defesas no sentido de que existem modificações de gosto endógenas, induzidas pelos investimentos do produtor, destinado a efetuar tais modificações.
A concepção consagrada, entretanto, é de que a vida econômica continua a ser um processo pelo qual o indivíduo impõe sua vontade ao produtor - a soberania do consumidor.
São três as concepções consideradas plausíveis a respeito do indivíduo na sociedade econômica: (1) o indivíduo é considerado um participante neutro ou passivo num processo de transmitir modificação. Pode começar pelo indivíduo, refletidas em seu consumo e assim transmitidas ao produtor através do mercado, ou pode originar-se do produtor. Em cada caso a preocupação é com o processo, e todas as modificações são transmitidas pelo mercado (os bens públicos não são satisfatoriamente abrangidos por esse modelo); (2) embora o processo seja presumivelmente um transmissor neutro de modificação assim como a modificação originada no produtor, a orientação fundamental vem do indivíduo, fazendo-se a ele a adaptação fundamental. A adaptação às modificações na função custo do produtor é neutra e técnica; a adaptação às modificações na função procura do consumidor é funcional e moral e abrange a funcionalidade do sistema. Este caso se adapta melhor às preferências do cidadão e eleitor individual pelos bens públicos. Admite-se as influências externas ao mercado, incluindo publicidade e influência competitivas e culturais. Para os bens públicos a informação é transmitida mais imperfeitamente pelo mercado e pelo processo político. A função procura é dada, o que quer dizer que se origina dele e não do produtor; (3) a adaptação fundamental, em grau significativo, compete ao produtor, através do qual a firma produtora controla seus próprios preços no mercado.
Paul Samuelson, economista líder reconhecido da comunidade da revolução keynesiana (que se contrapôs ao marxismo e se apresentou como alternativa à tradição econômica clássica não-socialista), afirma, em 1963, que "embora o processo seja confuso, indireto e ineficiente. admite-se igualmente que o cidadão afinal impõe sua vontade à seleção de bens públicos e serviços fornecidos pelo Estado."
Na economia consagrada não existe conflito geral: o indivíduo ou cidadão é soberano, o que não excluí diferenças entre indivíduos diferentes. Pelo antigo consenso clássico, os ricos falam mais autoritariamente nos mercados do que os pobres, mas nada é sistemático: o indivíduo está suprema e fundamentalmente no comendo.
Quando admitimos soberania do produtor, ela é exercida por organizações grandes e complexas, reação lógica às necessidades da organização industrial (moderna e altamente técnica e capitalizada). O Estado que se configura num modelo como este se aproxima a um comitê executivo da grande organização produtora - da tecnoestrutura.
A pobreza afeta a maneira como as pessoas se comportam. O primeiro e mais elementar efeito da pobreza é reforçar as atitudes e o comportamento que a fazem autoperpetuante. De modo semelhante, o primeiro efeito da riqueza é admitir a liberdade que permite a criação de mais riqueza. Geralmente as comunidades muito pobres são conservadoras - mais do que as mais afortunadas seu povo resiste à reforma em seu próprio interesse - toda a reforma é olhada com inquietação ou pavor; não há reconhecimento da inovação técnica benigna. Assim sendo, os pobres são classificados como subdesenvolvidos e modelados em tipos: (I) africano sub-saárico, onde não há base cultural. O problema não é ausência de aptidões, mas a saída de colonização recente, às vezes de tipo repressivo; tampouco há uma elite privilegiada dominante. Como no caso do Haiti, este modelo pode tornar-se de desintegração, com reversão eventual ao tribalismo ou anarquia; (II) caso latino-americano: grande massa do povo muito pobre. A base cultural é ampla, sustentada por um limitado sistema de forte tradição intelectual. Como nos países árabes, o controle evidente é a estrutura social e a maneira como ela tende a subverter o incentivo econômico e a produção. Em muitos países as massas rurais são indígenas, havendo acentuada exclusão racial. os governos são instáveis ou cobiçosos e a indústria moderna é vulnerável e dependente de proteção externa. Aplica-se também ao Oriente Médio; (III) Ásia Meridional, a base cultural é muito ampla e o entrave é o mau proporcionamento dos fatores de produção. São países de população grande e densa.
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Pode-se sugerir que a beleza e a elegância são coisas boas por todo o prazer que propiciam a uma comunidade. O mais econômico é o que promete mais prazer ao menor custo; a eficiência não tem o direito de sobrepor-se à beleza, num conceito mais adequado de eficiência - agimos com eficiência quando maximizamos o produto (neste caso, a beleza).
Hidráulica do Moinhos de Vento, em Porto Alegre, sede administrativa do D.M.A.E. |
Impérios. Os E.U.A. foram fundados por protestantes ingleses e escoceses contra uma Igreja de Estado (como o "establishment" da Inglaterra), pouco devendo ao Iluminismo.
Em 1850, os E.U.A. se estabelecem como novo império mundial norte-americano. Na história da república, imperialismo, originalmente, fora um fenômeno territorial - não transatlântico e global - com o propósito de aquisição de terras. Neste caso específico a questão se dava entre Canadá, E.U.A. e México, pois a Groenlândia era território dinamarquês e o Alasca pertencente aos E.U.A.. A decisão foi dos progressistas republicanos, conscientes do poder dos mares - Pacífico e Caribe - que queriam para os E.U.A. a posição de potência mundial, com primazia para as raças norte-americanas anglo-saxãs (nórdicas e teutônicas). A outra opção eram os populistas, mas estes não tinham política externa.
Era generalizado no povo norte-americano o desejo por prestígio e expansão, o que deu popularidade à guerra contra a Espanha com apoio dos demais governos europeus, em 1898, que se puseram contra ela. Depois disso o único perigo para a República eram as conspirações internas dos anarquistas.
O expansionismo transformou-se em imperialismo e essa foi a era do poder do mar e da democracia. A zona do Canal do Panamá foi adquirida; foi construída uma grande Marinha, que influenciaria o sistema de poder político europeu. Criou-se um "novo nacionalismo" não cosmopolita que era a imagem norte-americana do jovem herói do Oeste e seu ar puro: o renovado e saudável homem anglo-saxão.
Em 1912, foi aprovado o imposto federal sobre a renda e as eleições populares para senadores. Henry Ford e a automobilização, no Meio-Oeste, se impunham de maneira nacionalista e pacifista, materialista e utilitária, enquanto a visão progressista e sociológica de que lutas da sociedade e de classes - crença fundamental de Marx - substituíram as guerras de Estados e de Nações.
Seis anos depois, Wall Street era a capital das finanças mundiais e o dólar o símbolo da nação credora. Chegara a vez do partido Democrata tornar-se ferrenho opositor de mais envolvimento com a Europa. Neste sentido propunha atitudes condutoras do isolacionismo: anti-alemão, anti-bolchevique, anti-radical, anti-semita, anti-imigrante e anti-europeu. A Era do Jazz (1920) conviveu com uma política de apartamento da Europa e expansão para o Pacífico e Extremo oriente no que se referia aos negócios, embora houvesse interdependência financeira da Europa Ocidental e Central e os E.U.A.. Para as repúblicas latino-americanas, a política era de não intervenção e isolacionismo pois junto ao anti-semitismo surgiu o anti-catolicismo nos estados do sul e do meio-oeste estado-unidenses, o que progredia casado com o avanço republicano, a Lei Seca e a educação sexual.
A Grande Depressão de 1930 foi uma crise de confiança nas instituições financeiras que não afetou as instituições políticas da República. Roosevelt reagiu com o "new deal" e o "welfare", salvando o capitalismo norte-americano (que é socialista em seus métodos e em alguns de seus objetivos) e reabilitando a confiança nas instituições financeiras . Roosevelt era um patrício (não um burocrata) empirista e otimista na perfeição da sociedade. Uma nova direita surgiu na Europa e nos E.U.A.: radical, populista e nacionalista.
Quando as duas guerras mundiais estouraram na Europa e na Ásia o "lend-lease" (programa de empréstimo consignado) de Roosevelt o tornaram um internacionalista (contra Hitler, Tóquio e a favor da Grã-Bretanha) que mantinha depósito de 2/3 do estoque de ouro do mundo. Outro nacionalista (republicanos), Henry Truman, emerge dos benefícios do "new deal" e assume a presidência dos E.U.A. no pós-guerras baseado no patriotismo empresarial que para eles significava anti-comunismo. Sua política, a doutrina Truman, é de apoio à Grécia e Turquia, somada ao Plano Marshall de reconstrução econômica da Europa Ocidental mais a O.T.A.N. (E.U.A. e Canadá em defesa da Europa Ocidental em tempos de guerra e de paz).
Enquanto C.I.A. (fazendo eco à ideia dominante no início do século de que a melhoria na democracia dependia da educação) tornou-se o principal instrumento de política externa norte-americana (e anti-comunista) a prosperidade popular sofreu um inchaço nos E.U.A.. O fenômeno deveu-se a três movimentos simultâneos: (1) o aumento da renda mais veloz do que o aumento dos preços; (2) a disponibilização de bens de consumo: (3) a disponibilização de crédito ao consumidor. Na década dos 1950s (1950-60) não houve guerras, teve poucas crises, respeitando os padrões norte-americanos propostos durante o governo do presidente Wilson (1912). No final dessa década foram enterradas quaisquer aspirações a uma união ou confederação anglo (Império Britânico) - americana. O "novo nacionalismo" se firmava contra as imigrações do "velho mundo" que haviam sido muito intensas na primeira década do século 20. Isso pôs fim à cultura urbana e burguesa na história da civilização norte-americana. Rumo à sociedade pós-urbana-industrial-civil-burocrática houve o engajamento da população trabalhadora na administração e serviços no culto ao crescimento, que resultou inflacionário - o ouro começou a sair dos E.U.A..
Com exceção da agricultura houve declínio na produtividade. Cresceram os subúrbios e a automobilização com rápido declínio do transporte público. Todos os tipos de comunicação se estenderam e estabeleceu-se a indústria nuclear, enquanto a vida privada - pessoal e familiar - do norte-americano colapsava; ao mesmo tempo em que o padrão estado-unidense influenciava nas sociedades de consumo democráticas da Europa Ocidental. As raízes da expansão imperial norte-americana foram econômicas - o comércio acompanhou a bandeira. O envolvimento econômico do país no mundo acompanhava seu imperialismo materializado na extensão da presença militar e política dos E.U.A. pelos oceanos - o dinheiro é consequência e não causa do movimento das mentes. Não existe o determinismo do homem econômico senão que a união dos empreendedorismos público e privado num "capitalismo do povo" que se iguala ao socialismo estatal, que mantém uma aristocracia de banqueiros e advogados. O automóvel - marca do século 20 - faz do homem senhor do seu tempo, mas não do seu espaço que era limitado por leis contra a imigração, a xenofobia erudita das massas democráticas, a eugenia e também a classe social. A classe média, por exemplo, tinha posse padronizada de comida, roupa e abrigo, diferente da burguesia que é um fenômeno histórico (enquanto aquela é um fenômeno universal e sociológico). Os carros norte-americanos eram os carros de luxo do mundo: cadillac, o lincoln e la salla, pouco abaixo do rolls-royce. Antes da Segunda Grande Guerra era o Ford; depois de 1950 era o alemão Volksvagen; em 1980 os republicanos em apoio à livre iniciativa alavancaram à Chrysler norte-americana.
Para a intelectualidade norte-americana, anti-semitismo era anti-catolicismo. Depois de 1945 ser católico não era mais problema porque era sinônimo de anti-comunismo. Em 1953, surgiu a revista Playboy. Em 1960, John Fitzgerald Kennedy, nacionalista, favorável ao desenvolvimento do Estado de bem-estar social, com tendências liberais, tornou-se o primeiro presidente católico dos E.U.A..Era acusado de mundanismo (de acordo com Historical Statistic of the United States, em 1920, a Igreja Católica Romana era a terceira da nação, embora o número de católicos fosse de apenas 20%) e modernismo, adepto da fé de ethos, costumes e hábitos de pensamento e não uma moralidade sobrenatural de filosofia tradicional. É dessa época a formação da Escola de Divindade da Universidade de Chicago, na qual os negócios (business) estavam intimamente relacionados à moral. Em 1963 uma onda de pornografia norte-americana se fez notar. Em 1964 o texano Lyndon Johnson criou a "grande sociedade" estendendo direitos civis e eleitorais a negros e minorias. A partir de 1965, a erosão do dólar e a produtividade começam a declinar. Surgem problemas sociais e crises raciais; aumentam as taxas de criminalidade, mas o acesso ao dinheiro é fácil. O casamento ainda é um ideal, mas a criação dos filhos, os padrões de consumo doméstico e social não pertenciam mais a padrões internos do casamento. Mulheres casadas saem em busca de emprego fora de seus lares, resultado do enfraquecimento das ideias burguesas. Os E.U.A. entram em guerra contra o Vietnam até 1968, data do Festival de Woodstock. No ano seguinte o programa espacial dos E.U.A. vai à Lua.
Com a década dos 1970s começa o fim da prosperidade norte-americana - fim do lastro ouro estado-unidense, o fim do New Deal e é aprovado o direito de aborto. O ex-ator de Hollywood, Ronald Reagan assume a presidência dos E.U.A. nos 1980s; 200 anos depois da fundação do Estado norte-americano, a comunidade nacional de caráter essencialmente anglo-saxão e anglo-ceuta declinou, sobrevivendo apenas dentro das mais resistentes instituições da República, devido às ondas de imigração, enquanto em 1900 as cidades possuíam em média 40% de estrangeiros. A "religião-cívica" norte-americana da igualdade democrática e os puritanos da igualdade humana e educação passam a conviver com a cultura intelectual norte-americana à esquerda da política e do modernismo monopolizada pelos liberais e marxistas, que fazem dela a mudança da sociedade produtiva para a sociedade intelectual-administrativa. A inteligência cede lugar à burguesia e seus acessórios: eletrodomésticos e carros, patrocínio das artes, entretenimento formal e deveres sociais, assumindo a boa administração doméstica, e a responsabilidade pela domesticidade. Nas palavras do espanhol Ortega y Gasset, o mais importante filósofo conservador do século 20, "a civilização burguesa é a única que contém a noção de civilização como a conhecemos" (in "A rebelião das massas"). E assim, forma-se o estilo norte-americano, representado, no século 20, pelo expressionismo-abstrato na pintura, a pictorização (subcultura, enquanto sistema de significados partilhados com a cultura popular e com os significados da cultura em geral), o rock-and-roll, Lloyd Wrigth na arquitetura e Norman Rockwell na ilustração, entre outros.
No. 6
Multidão e democracia no mundo do espetáculo. O espetáculo talvez seja o único espaço negociado em que a multidão é esperada como tal, mesmo que ela assuma, na condição de público, aspectos de unidade que não lhe pertencem.
Na tradição da teoria política somente o "uno" pode governar, seja o monarca, o Estado, a nação, o povo ou o partido.
Monarquia, aristocracia e democracia são as três formas de governo, tradicionais, que constituem a base do pensamento político europeu antigo e moderno. Este princípio do pensamento político, segundo o qual só o uno pode governar, solapa e nega o conceito de democracia. neste sentido, a democracia, assim como a aristocracia, é apenas uma fachada, pois na realidade, o poder é a monarquia. Somente o uno é soberano, afirma a tradição. A alternativa é absoluta: soberania ou anarquia.
No pensamento europeu, essa insistência no uno frequentemente se caracteriza como continuidade do legado de Platão. O uno é o alimento ontológico imutável, ao mesmo tempo origem e télos, substância e comando. Essa falsa alternativa entre o governo do uno e o caos é com efeito reiterada em várias permutações através da filosofia política e jurídica européia. A multidão não é um corpo social porque a multidão não pode ser reduzida a uma unidade e não se submete ao governo do uno.
Carl Schmitt (1985) é o filósofo moderno que mais claramente colocou o caráter central da soberania para a política, renovando as primeira teorias europeias modernas de soberania absoluta articuladas por autores como Hobbes e Jean Bodin. O soberano é definido positivamente como aquele acima do qual não existe poder e que, portanto, é livre para decidir, e, negativamente, como o que é potencialmente eximido de todas as normas e regras sociais. O conceito tecnológico-político de "Estado total" enunciado por Schmitt, que coloca a soberania acima de toda outra forma de poder, como única possível fonte de legitimação, desenvolve a concepção moderna de soberania em direção a uma forma coerente com a ideologia fascista. Schmitt polemizou duramente na Alemanha de Weimar contra as forças do pluralismo liberal e parlamentar, que, para ele, ou bem negam ingenuamente o domínio do soberano (anarquia), ou bem mascaram o soberano por trás do jogo de forças plurais, solapando suas capacidades. A teoria da moderna soberania em política (sujeito político unitário) se harmoniza com as teorias e práticas capitalistas da gestão econômica. deve haver uma figura unitária que possa assumir a responsabilidade e decidir no campo da produção, não só para que haja ordem econômica, mas também para que haja inovação. Ao excepcionalismo soberano corresponde a inovação econômica como forma de governo industrial.
A soberania tem dois lados. O poder soberano não é uma substância autônoma e nunca é absoluto, antes consistindo numa relação entre governantes e governados, entre proteção e obediência, entre direitos e obrigações. É necessariamente um sistema dual de poder. O soberano também é obrigado a negociar uma relação com os governados e solicitar seu consentimento no terreno econômico. Na sociedade capitalista - diziam Adam Smith e David Ricardo - o trabalho é a fonte de todas as riquezas. O trabalho, dizia Marx, é antagônico ao capital e representa constantemente uma ameaça à produção, através das greves, da sabotagem e outros subterfúgios, mas o capital não pode dispensar o trabalho. Nada pode sem a sua produtividade. Sem a participação ativa dos subordinados, a soberania desmorona. O outro lado, segundo Negri e Hardt (2005), é o bio-poder, tendência da soberania para tornar-se poder sobre a própria vida, quando o poder político já não se orienta simplesmente par a legislação de normas e a preservação da ordem nas questões públicas, devendo promover a produção de relações sociais em todos os aspectos da vida.
O poder soberano não deve apenas dominar a morte, mas também produzir vida social. Por outro lado, a produção econômica torna-se cada vez mais bio-política, voltada não só para a produção de bens, mas em última análise para a produção da informação, comunicação, cooperação - em suma, a produção de relações sociais e de ordem social. Assim é que a cultura vem a ser diretamente um elemento tanto da ordem política quanto da produção econômica.
Quando a multidão finalmente se torna capaz de governar a si mesma, a democracia é possível. A democracia da multidão precisa de uma "nova ciência", ou seja, um novo paradigma teórico para enfrentar esta nova situação.
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Parque da Redenção - Porto Alegre |
Polissemia das práticas. O caso chinês. Essa reflexão sobre coleções de arte e mercado tenta alcançar as discussões sobre polissemia das práticas associada à dotação de novos significados dentro da tradição ocidental moderna, ancorada nos subsídios do Museu Histórico Nacional, numa conjuntura marcada pela passagem dos produtores a consumidores, contexto no qual o mercado de arte é espaço privilegiado do ceticismo.
Neste novo mercado os profissionais - compradores e vendedores - são poderosos e imprescindíveis mediadores que definem não apenas as identidades, mas as disputas e fluxos de objetos, as histórias de vida de artefatos e pessoas não só no mercado primário como no secundário (de revendas) de valores históricos - científicos - estéticos consolidados ou em vias de consolidação.
Antropologicamente, identidade é construção, desconstrução e reconstrução relacionais. Para Appadurai (1986), a circunstância histórica dos objetos é obtida nos objetos mesmos, através da inscrição de significados em suas próprias formas, usos e trajetórias. São as coisas em movimento (things-in-motion) que se caracterizam como bens cuja classificação se modifica a cada particular contexto de suas vidas sociais. A percepção deste movimento decorre da relação da biologia cultural de bens específicos com a história social de um tipo de coisa, o que requer o exame da trajetória total do objeto de sua produção a cada tipo de consumo. Nesta trajetória o cruzamento de fronteiras culturais e sistemas de significado formam o regime de valor em consonância com a concepção ampla de mercadoria. A demanda seria uma função de práticas e classificações sociais e não uma resposta a desejos e necessidades. Essa função está intermediada por mediadores e formadores de gosto.
Incluem-se neste recorte os bens de luxo e sua correlata expertise, os serviços nas complexas sociedades capitalistas validados no universo das coleções. A elucidação das histórias de vida dos objetos é dada por sua dimensão processual, leilões e feiras de arte - seus espaços sociais por excelência, intra e entre unidades culturais que legitimam estes relacionamentos, mesmo que considerados inadequados em outros contextos. A reunião de diferentes sistemas culturais onde um mínimo de entendimento dos bens em questão é compartilhado, acorda apenas com os termos do negócio. A biografia dos artefatos é múltipla em funções e papéis que podem se dar em contexto cultural razoavelmente homogêneo para indivíduos que se apropriam deles e movem-se simultaneamente por necessidades e prioridades distintas, não necessariamente relacionais. Portanto, a polissemia das práticas não precisa estar estabelecida por distintos agentes sociais que dominam códigos simbólicos diversos de objetos para datá-los de um determinado sentido, como exemplifica Veiga (2012) "as baixelas de prata do universo curial europeu no século XVIII.": a partir de 1726, D. João V e a corte portuguesa recorriam às oficinas francesas (Germain) para sua prataria civil, cujo uso ritual era ditado por Versailles (codificação observada por seus aliados e adversários). Hábil ourives da época, embora fosse arquiteto, foi recomendado por D. Luis da Cunha a D. João V. D. José I, encomenda a ele a reposição da baixela dos Braganças em quatro cobertas que ele não pôde completar por falência, gerando, esta falta, comentários (de que se têm registro) entre embaixadores e o guarda-jóias da coroa, que demonstraram como o luxo, no século 18, era já polissêmico. A prataria Germain é um dos orgulhos do patrimônio lusitano e continuou a ser utilizada em Portugal nas recepções republicanas. Os objetos seguiram sua carreira no serviço de festas e cerimônias públicas do governo. Em 1926, o Museu Nacional de Arte Antiga conseguiu 300 objetos da baixela Germain para seus acervos. Os demais objetos da baixela continuam sua carreira de bens utilitários de luxo nos atos oficiais no Palácio da Ajuda.
A polissemia simbólica fica clara na disputa por criações, procedências, colocando a definição da leitura correta de seu significado no centro do embate público tanto quanto os próprios bens. O virtuosismo semiótico desse tipo de contenda evidencia a prioridade dada à economia, à política e à cultura em cada caso.
Não há sociedades monoculturais no mundo pós-modernidade, da fragmentação, do multiculturalismo, da concepção de identidades baseadas no nacional e no classista. A postura chinesa quanto à complexidade polissêmica e à restituição de patrimônio perdido afeta a classificação de arte, que restringia-se a poucas manifestações resultantes de um longo e exigente aprendizado intelectual, com supremacia da pintura, da caligrafia e da poesia. Essas "três perfeições" (san jue) representam o máximo da estética clássica chinesa. Essa arte estava voltada a um grupo específico do Celeste Império: os letrados, que integravam sua elite dirigente; enquanto membros da elite dirigente , os artistas compartilhavam seus valores e criavam para os seus pares. A estética chinesa passa a sofrer influência das preocupações da arte ocidental. A arte contemporânea chinesa diz respeito a um duplo deslocamento artístico e de inserção social de seus criadores o que tem que ser entendido enquanto novo investimento simbólico exemplificando o exercício da polissemia.
Em 2009, o mercado de leilões chinês alcançou 3,2 bilhões de dólares quando em 2004 eram 1,1 bilhão, sob supervisão constante do Center of International Cultural Exchange, órgão que cuida da administração estatal da herança cultural chinesa, responsável, inclusive, por inspeções no exterior, ação acusada pela imprensa norte-americana de nacionalista e escamoteadora das tensões entre a ideologia marxista e a lógica das forças de mercado.
O comportamento dos novos compradores chineses apresenta constantes. Além das cívicas restrições patrimoniais desprovidas de referências básicas dado o contexto sócio-político em que foram criados, os novos miliardários chineses buscam formas e caminhos confiáveis de diversificação de seu portfólio para constituírem uma identidade pública que lhes permita oferecerem gratificações estéticas associadas a fruição pública de suas fortunas e a posse de bens históricos chineses no mundo pós-Mao. Suas compras não estão restritas às obras ligadas a seus pais. Não demonstrando, entretanto, interesse pelos old masters europeus. Sua atuação é ativa nas casas de leilões como compradores que garantem a maior e mais lucrativa possibilidade de expansão dos negócios.
Os mais fabulosos ricos do mundo estão na China. Em suas compras estão a marca imperial das peças e a procedência de coleção ocidental (ou japonesa), que nem sempre tem como prioridade à autenticidade. O cruzamento entre ambas é decisivo. O que imprime desejabilidade aos objetos são as fases da carreira passada dos bens. Compram-se assim ideias e valores sob a forma de símbolos. Os bronzes arqueológicos, por exemplo, deixaram de ser práticas sacrílicas dos ancestrais e morte para virem compor as coleções chinesas, mudança de mentalidade introduzidas por Hong Kong e Taiwan.
A virada do século 20 para o 21 foi marcada por novas carreiras aos objetos, resultado de novos enquadramentos estéticos e novas concepções da história da arte decorrentes das novas tecnologias de comunicação e informação como vetores: a bricolagem virtual, a propriedade intelectual, a pirataria digital, redefinições do público e do privado. Além disso, o mercado secundário (leilões) toma a dianteira sobre o mercado primário de compradores e vendedores no mercado de arte, transformando os grandes pregões públicos na mediação por excelência para a formação das coleções de arte e para as carreiras e importância dos colecionadores, inflacionando os preços destes bens, instituindo uma comunidade concreta de troca entre pares privilegiados. Assim, na primeira década do século 21, o mercado de arte foi escandalizado por uma nova categoria de sub-colecionadores que assumem o primeiro plano no mundo da arte e passaram a ser cortejados por leiloeiros e marchands. Dentre eles Ronald Lauder, herdeiro da empresa de cosméticos Estée Lauder e a compra de um Gustav Klimt; o bilionário da indústria de entretenimento David Geffen (ex-sócio de Steven Sprelberg) adquiriu um Jackson Pollock; a compra de um Kooning pelo bilionário de fundos hedge (fundos que adotam estratégias não tradicionais) Steven Cohen.
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A reorganização de Wall Street originou as fortunas atuais que compartilham seu prazer estético em exposições. É forma de expressão das casas de leilões que se "conquista" uma obra. A arte como investimento sério pressupõe na compra de opções futuras do significado cultural de um obra, sem esquecer que o investimento em arte contemporânea requer compras de renovação do estoque antigo, sem perder de vista as diferenças entre colecionadores, comerciantes e acumuladores e suas intenções e práticas.
No. 8
Pluralidade cultural alemã e América. Na descoberta do "Novo Mundo" os alemães estavam atentos - à cartografia e comércio. A mais antiga representação do globo terrestre é do século 15 e o autor foi o alemão Martin Behaim. O famoso mapa-mundi de outro Martin, Waldseemüller, em 1507, utilizou os relatórios de viagem de Américo Vespúcio e chamou o novo continente "América". Talvez ninguém lembre o cartógrafo, mas o nome ficou. O primeiro mapa que detalha a costa brasileira, datado de 1515, é de autoria do cartógrafo alemão Johann Schöner. Depois do Tratado de Tordesilhas (1494), o importante empório da família Weiser em Augsburg, no sul da Alemanha, estabeleceu-se com uma filial em Lisboa (1503) para criar laços comerciais com o Novo Mundo. Em 1519, os banqueiros Weiser e Fugger subsidiaram maciçamente a eleição de Carlos de Habsburgo para imperador do Sacro Império Romano de Nação Germânica, que foi coroado imperador alemão com o título de Carlos V ao tempo rei da Espanha. Pela ajuda financeira foram recompensados com privilégios nas colônias espanholas. Os Weiser também foram contemplados com uma feitoria em Santo Domingo e uma donatoria na Venezuela onde, inclusive, plantavam cana-de-açúcar e mantinham minas de cobre instaladas nos moldes alemães, o que trouxe 50 mineiros da Saxônia e suas mulheres, sendo o primeiro empreendimento do gênero na América. Nikolaus Federmann, de Ulm, escreveu um dos primeiros relatos detalhados sobre a região norte da América do Sul e participou da fundação de Bogotá (1539). Entretanto, começaram disputas entre o catolicismo e o protestantismo. Os privilégios dos Weiser terminaram em 1544, quando o conselho das Índias decidiu nomear um governador espanhol para a colônia. Os Fugger receberam a donatoria em Chincha Alta, no Peru e o estreito de Magalhães (1531). Além desses, tornaram-se conhecidos Hans Staden e Ulrich Schmidel, que presenciou a fundação da cidade de Assunção. Ambos publicaram sobre suas experiências causando grande sensação na Alemanha, onde a imprensa tipográfica era mais desenvolvida em decorrência da notável invenção de Guttemberg (1450). A primeira tipografia na América Latina foi instalada pelo alemão Jacob Cromberger que publicou no México a partir de 1539.
Importantíssimo para as relações entre a Alemanha e a América do Sul foi a chegada ao Novo Mundo dos jesuítas alemães a partir do final do século 16, radicados nas reduções entre os rios Paraguai e Paraná, com o intuito de missionar e civilizar a grande população de índios nômades. Além de dedicarem-se a vários setores, cultivavam habilidades sofisticadas como a fundição de sinos e a construção de instrumentos musicais. Criaram hospitais, escolas e oficinas. A primeira farmácia argentina foi criada por um padre alemão na cidade de Córdoba (1698). Os jesuítas muito contribuíram para a desmistificação da América Latina na Europa e para a valorização da cultura indígena. Entre estes acontecimentos e a Feira do Livro de Frankfurt de 1976 (primeira edição) passaram-se mais de 300 anos. Naquela Feira a literatura latino-americana foi escolhida como o tema central, colocando autores como Ángeles Mastretta (1949, México), Isabel Allende (1942, chileno/norte-americana), Jorge Luis Borges (1899-1986, argentino), García Marques (1927-2014, colombiano) e Mário Vargas Llosa (1936, Peru, Nobel de Literatura em 2010), por muito tempo na lista dos mais vendidos na Alemanha.
Os museus e galerias alemães se encheram das figuras gigantescas do figurativista Fernando Botero (1932, Colômbia) ou do neofigurativismo de José Luis Cuevas (1934-2017, México, premiado na V Bienal de São Paulo), Jesús-Rafael Soto (1923-2005, Venezuela) com seu abstracionismo geométrico e arte cinética, a escultora Alicia Penalba (1913-1982, Argentina), e a surrealista Frida Khalo (1907-1954, México). Kassel sedia a cada 5 anos os principais expoentes da arte contemporânea. São também valorizados o cinema e a música na maratona de consertos de Colônia.
A estrutura federalista é marcante na vida cultural alemã, cuja pluralidade se manifesta na distribuição regional de diversas instituições e atividades culturais na Alemanha, como a Biblioteca Alemã (entidade federal). As entidades culturais na Alemanha são em grande maioria mantidas pelos municípios e comunidades. Os Estados legislam sobre o setor cultural. A mídia é assunto correlato, mas à parte. Além da estrutura organizacional interna da Alemanha, existem organizações culturais medianeiras de coordenação e intercâmbio cultural internacional, resultado de acordos culturais que são financiados pelo orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Os mais importantes são o Instituto Goethe, o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD), a Fundação Alexandre von Humboldt, o Instituto de Relações Internacionais e a INTER-NATIONES.
Na literatura alemã da primeira metade do século 20, foram destaques o nobel de literatura (1929)Thomas Mann, o expressionista Gottfried Benn e o dramaturgo Bertolt Brecht. Depois da Segunda Guerra Mundial houve uma tentativa de parte dos escritores de fazer a experiência chocante da guerra e da destruição, apoiando-se para isto em exemplos estrangeiros ou no modo de pensar existencialista ou de tradição cristã, o seu tema. Essa tendência consiste em não debater a questão política, mas em fazer reflexões sobre a culpa do alemão e sua derrota por meio de símbolos religiosos ou retirados de uma visão de mundo, recorrendo frequentemente ao modernismo literário proscrito por 12 anos. Exemplificam essa tendência o drama de W. Borchert, os contos de H. Böll e de A.Schmidt, a lírica de Paul Celan, de Günter Eich e de Peter Huchel. Nos anos 1950-60 o tema literário era o confronto com o passado recente, a crítica ao "milagre econômico", a rápida construção de um novo bem-estar material, presente nos autores alemães W. Koeppen, H. Böll, S. Lenz e o nobel de literatura (1999) G. Grass. Central foi o Grupo 47, agrupamento informal de escritores de língua alemã iniciado por Hans Werner Richter que realizaram até 1967 encontros literários cada vez mais politizados, cujos integrantes viam-se como uma instância moral. Seu representante mais proeminente, Heinrich Böll recebeu o nobel de literatura em 1972. menos preocupados em interpretar a realidade do que em descrevê-la sem emoções havia outra ala da qual faziam parte J. Becker, R. D. Brinkmann, A. Kluge (pós-modernista, um dos mais importantes intelectuais alemães contemporâneos) e D. Wellersholf. Contrapondo-se a estas tendências está a poesia concreta que abstrai conteúdo para transformar a linguagem em literatura: M. Bense, E. Gomringer, H. Heissenbüttel, Franz Morin. A geração revoltosa de 1968 trouxe tendências esteticistas da literatura que, de acordo com a crítica, dissimulavam causas sociais e econômicas da estrutura da economia consideradas injustas, levando muitos autores a procurar o engajamento político, que conduziram também à busca de novos papéis e novas formas de literatura cujas expressões mais radicais são a tese da "Morte da Literatura", de Hans Magnus Enzensberger (Prêmio Príncipe de Astúrias em 2002) ou a "Estética da Rebelião" de Peter Weiss. Soma-se a essa literatura política o teatro documental - Rolf Hachhuth e Heinar Kipphardt - que se liga em conteúdo e intenção ao gênero reportagem partidária, como em Günter Wallraft e da literatura do mundo trabalhista. Junto a estas tendências alguns individualistas impuseram-se como autores centrais na sua época, como foi o caso de A. Schmidt, através de sua exposição séria e irônica subjacente ao "ser intelectual" num mundo de indiferença e ausência de espírito do ceticismo de Schopenhauer que lhe conferiu agudeza à visão do trágico e do cômico da existência humana.
Num balanço da produção literária do pós-guerra até o fim do socialismo real existente na R.D.A. de 1989/90 e na União Soviética de 1991, a década de 1950-60 chega ao esgotamento por falta de originalidade e agudez de pensamento enquanto a geração de 1968 passou a se expressar através de performances, música e filmes.
Destacaram-se neste balanço crítico Marcel Reich-Ranicki (o "papa da literatura") e o judeu Victor Klemperer. A literatura na R.D.A. tomara um rumo diferente da ocidental, pois não havia liberdade de informação e opinião e as restrições eram muitas, pois o país houvera doutrinado pela ideia literária soviética do "realismo socialista".
Até 1961, a alternativa era a fuga como fez Uwe Johnson. Portanto 1950-60 foi dominado por uma literatura conformista, banal, sem inovações ou debates com a vanguarda do século 20, que, inclusive era proibida, assim como as correntes filosóficas contemporâneas. Ausentes Franz Kafka, James Joyce, Samuel Beckett, Vladimir Nabokov e mesmo Friedrich Nietzsche, formou-se a mediocridade oriunda da uniformidade ideológica. Deste período sobressaíram-se apenas Heiner Müller e Christa Wolf, apesar de seguirem presos ao amago socialista. mesmo a crítica dentro das obras literárias era esporádica e comedida. A literatura da R.D.A. teve a particularidade - dentre os países do Leste Europeu sob o domínio soviético - de ter sido predominantemente afirmativa. No período do pós-moderno de Botho Strauss, destacou-se por empreender em seus contos e romances a tentativa séria de apreender a face insondável do presente na linguagem e em sequências cênicas, através de quadros místicos.
A década de 1990-2000 ainda requer distanciamento para que o fim da divisão política e ideológica da Europa e da Alemanha possa ser trabalhada literariamente com fatos históricos tão importantes e permita uma resposta sobre de que modo influenciaram ou modificaram a literatura alemã. Surgiram alguns casos, até premiados, mas a filosofia do pós-guerra na Alemanha foi de profunda cisão e prolongada insegurança. Martin Heidegger (1880-1976) que embasou o existencialismo transformou-se em um dos intelectuais mais controvertidos do pós-guerra por sua temporária aproximação do Estado nazista de forma demonstrativa. Seus princípios existencialistas continuam sendo determinantes e suas teorias foram desenvolvidas por Karl Jaspers, Hans-Georg Godamer, Karl Löwith e Jean-Paul Sarte, na França.
A corrente filosófica ligada ao positivismo desenvolveu-se nos países anglo-saxônicos representada, apesar das divergências, por Ludwig Wittgenstein, Rudolf Camap ou Karl Popper pela tradição da filosofia linguística e da filosofia analítica e teve em Wolfgang Stegmüller o representante mais influente na Alemanha.
A partir de 1960 cresceu a influência da Escola de Frankfurt: judeus e filósofos de tradição marxista que deixaram a Alemanha no período nazista. A "teoria crítica" que marcou sua época voltou-se tanto contra a tradição conservadora e a política dos adeptos do existencialismo como contra a tendência do positivismo de reconhecer a situação existente como determinada pela natureza.
Na década de 1970 a filosofia alemã abriu-se para a tradição anglo-saxônica, enquanto esta última absorvia progressivamente impulsos do pensamento europeu continental. A filosofia de Jüngen Habermas é uma tentativa de reunir elementos significativos da filosofia continental do ocidente com componentes anglo-saxões e assegurar os valores com caráter geral de validez e a ligação estreita com a facticidade, no que se diferencia do sociólogo Nicklas Luhmann que acentua o sentido autônomo do desenvolvimento de sistemas como a sociedade, a economia e a política.
A produção de livros da R.D.A. ocupa o terceiro lugar no mundo, depois da Inglaterra e da China.
As cidades que são mais importantes centros editoriais são Munique, Berlim, Frankfurt do Meno, Stuttgart, Colônia e Hambuergo.
Não há editora com domínio de mercado.
A ideia da educação popular, no pós-guerra, fez com que novas camadas de leitores fossem conquistados pelos clubes de livros. O Grêmio de Livros Guttenberg, por exemplo, foi fundado por sindicatos.
O mercado livreiro, ao lado do farmacêutico, é o único setor da economia alemã onde a lei permite o tabelamento dos preços de venda ao consumidor já na entrada do século 21, garantindo o amplo abastecimento da população com o bem cultural livro.
A Feira do Livro de Frankfurt, realizada todos os anos em outubro, é a principal e é um acontecimento internacional no ramo livreiro onde uma grande porcentagem das vendas mundiais de licenças e direitos autorais ocorre.
Em 1976, introduziu-se na América Latina a ideia de prestar uma homenagem especial a continentes e países. Em 1994, o Brasil foi o tema. O ponto-alto da Feira do Livro é a entrega do Prêmio da Paz do Comércio Livreiro Alemão.
A segunda maior Feira do Livro, em importância, é realizada em Leipzig, na primavera setentrional, que funciona especialmente como intermediária em relação aos países do Leste Europeu.
A Alemanha não possui uma biblioteca nacional centenária. Em 1913, a Biblioteca Alemã de Leipzig começou a colecionar todos os escritos em língua alemã. Em 1947, a Biblioteca Alemã de Frankfurt do Meno assumiu as mesmas funções desta no Oeste. Ambas foram fundadas pelo comércio livreiro e tornaram-se instituições federais em 1969. Em 1990, ambas foram reunidas.
A partir de 1930, muitas bibliotecas foram fundadas, inclusive universitárias, algumas como a Herzog August, de Wolfenbüttel, contendo 12.000 manuscritos medievais. As bibliotecas alemãs são mantidas, principalmente, pelos municípios e pelas igrejas.
http://www.buchhandel.de.
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